Quem Foi Edward Tylor e Qual a
Sua Importância Para a Antropologia? Qual Era a Relação da Cultura dos
Povos Para o Estudo Antropológico? O Que Foi a Teoria da Degenerescência?
A grande
abertura para a visão europeia da civilização deveu-se ao filho de um fundidor
de latão de Londres. Edward B. Tylor, quando jovem em vez de frequentar uma
escola pública, foi mandado para uma escola quacre ([1])
e, aos 16 anos, começou a trabalhar no negócio da
família.
Aliás, em
virtude de ser dissidente, não poderia ser admitido na universidade. Assim, a
sua herança quacre livrou-o de definir a “cultura” como o produto peculiar dos
clássicos gregos e romanos e da igreja nacional.
A
desconfiança quacre em relação às belas-artes também o livrou de confinar a
“cultura” no molde vitoriano de Mathew Arnold e, quando se tornou o primeiro
professor de Antropologia de Oxford em 1896, vangloriou-se de nunca ter se
submetido a um exame.
Aos 23 anos a
família mandou-o viajar por causa da sua saúde e, em vez de fazer a grande
volta pelas capitais europeias, Tylor foi para a América. Vagabundeando por
Cuba, travou amizade com Henry Christy – um rico banqueiro que, por
coincidência, também era quacre.
Para os
quacres os costumes de povos antigos tinham um significado ético, pois eles
documentavam a fraternidade humana e apoiavam o impulso antiescravagista.
No Ocidente
europeu, as palavras e as ideias que descreviam as realizações sociais do homem
tinham adquirido um significado auto respeitoso. Originalmente, a palavra
“cultura” (do latim “cultus”, “adoração”) significava “homenagem
reverente”.
Depois passou
a descrever a prática de cultivar o solo e, mais tarde, estendeu-se ao cultivo
e ao refinamento do espírito e das maneiras. Finalmente, por volta do século
XIX, “cultura” tornou-se o nome do lado intelectual e estético da civilização.
Segundo
Mathew Arnold, “cultura” era “o nosso relacionamento com o melhor que foi
conhecido e dito no Mundo”. Mas, Tylor agarrou-se à palavra e operou maravilhas
para esvaziar de matizes chauvinistas e provincianas.
E, por ter
transformado a palavra “cultura” num termo neutro e no foco de uma nova ciência
social, Tylor é geralmente considerado o fundador da Antropologia cultural
moderna que, no seu tempo, se chamou “a ciência de Mr. Tylor”.
Ele notou que
muitos pensadores eminentes tinham “conduzido a história apenas até o limiar da
ciência” e, perfilhando o provérbio de que “o mundo todo é um país”,
Tylor sentiu-se encantado com a “correspondência” existente entre os costumes
de povos muito afastados uns dos outros.
Evitou a
palavra no plural – “culturas” – e preferiu o singular maiúsculo (“Cultura”).
Por exemplo, via “uma diferença que mal chegava a um palmo” entre um camponês
inglês, usando seu machado, ouvindo histórias de um fantasma de uma casa
assombrada e os costumes similares dos negros da África central.
A fim de pôr
à prova sua doutrina da sobrevivência, Tylor entrou ousadamente na arena mais
controversa que encontrou: _ a religião. O “animismo” foi a palavra que
escolheu para a forma mínima de religião, que definiu como uma crença em seres
espirituais.
Os selvagens
viram esses seres espirituais em plantas, animais e características da
paisagem. E todas as religiões evoluíam a partir de tais conceitos religiosos –
passando de uma crença num estado futuro para uma identificação posterior com
elementos morais e daí rumo ao monoteísmo.
Enquanto
Darwin ousou um ataque de flanco à ortodoxia cristã, o ataque de Tylor foi
frontal. A sua abordagem da espécie humana foi um golpe ameaçador – e porventura,
fatal – desferido contra os dogmas do Éden, as inesperadas revelações do
evangelho cristão e de um Salvador.
Seria
possível que as grandes verdades do monoteísmo e do cristianismo se tivessem
desenvolvido gradualmente a partir de toda a experiência humana à escala
mundial?
A
escandalizadora ciência da cultura de Tylor criou nos aguerridos defensores do
dogma cristão da degenerescência humana. Richard Whateley, bispo anglicano de
Dublin e apóstolo dos irlandeses pobres, formou-se como um hábil defensor da fé
com seu primeiro livro, escolhendo como alvos Adam Smith e outros partidários
do progresso.
Após
descrever com repugnância os selvagens e canibais encontrados por missionários,
perguntou: _ “Podia esta criatura perdida abrigar em si algum dos elementos da
nobreza? ”. Se os povos selvagens revelavam habilidades nas artes, isso devia
seu uma relíquia de uma civilização avançada da qual tinham degenerado.
A teoria da
degenerescência de Whateley foi a inimiga mais popular do método comparativo de
Tylor e, consequentemente, também de uma ciência da cultura.
A “teoria da
progressão” de Tylor delineava ousadamente toda a história humana como “o
desenvolvimento da cultura” e perguntava “se encontrarmos um único caso
registrado de um povo civilizado cair independentemente num estado selvagem”.
Dominado pela
recente ideia vitoriana de “desenvolvimento” (isto é, de que todas as
sociedades tinham seguido um único curso de evolução, umas mais latentes do que
outras), Tylor achava tentadora uma visão linear do progresso humano.
Ele projetava
um brilho otimista sobre o futuro de todos os povos e, ao mesmo tempo, tornava
todas as culturas “primitivas” vivas uma rica e acessível fonte de história.
No entanto,
Tylor não se considerava o profeta de um dogma e sim o descobridor de uma
ciência. Dedicou os últimos 20 anos da sua vida a organizar e fomentar a sua
ciência da cultura sob o nome de Antropologia e, sob a sua orientação, o
Instituto Real de Antropologia tornou-se um ativo parlamento da ciência
antropológica.
Ele convenceu
a British Association for the Advancement of Science a empreender um estudo das
tribos pouco conhecidas da costa do Canadá. Esse estudo de doze anos efetuado
por Franz Boas, foi supervisionado pelo próprio Tylor e preparou Boas para vir
a ser o grande revisor da ciência daquele.
Boas fez mais
do que ninguém para liberar a ciência da cultura dos preconceitos tacanhos da
Inglaterra de Tylor.
Se – como
Tylor insistiu – toda a humanidade tinha capacidade igual para desenvolver
formas culturais, então deveria ter havido muitos caminhos e destinos
diferentes para o progresso humano – tantos quantas as circunstâncias da
geografia, do clima, da língua e dos acidentes históricos. Boas via a cultura
triunfante.
Todos os
povos sobreviventes, argumentava ele, se tinham desenvolvido igualmente, mas
havia tantos modos de desenvolvimento quantos os grupos. Crente, Boas era ainda
mais desenvolvimentista do que o seu mentor.
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([1]) Membro
de uma seita protestante inglesa (a “Sociedade dos Amigos”), fundada no século
XVII [Prega a existência da luz interior, rejeita os sacramentos e os
representantes eclesiásticos, não presta nenhum juramento e opõe-se à guerra.
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