O Que Aconteceu Antes dos Tempos Bíblicos na História Humana? O Que o Público dos Museus Desejava Aprender? Como Era Divida a Pré-História?
No século
XVIII, os devotos cristãos ainda continuavam acreditando a cronologia bíblica –
que fixara o Criação no ano 40014 a. C. – demasiado reconfortante para
abandoná-la. Para eles, todo o curso da história inicial decorria do Éden,
passando por Jerusalém e estava datada na Bíblia.
Os
acontecimentos antigos que diziam respeito aos cristãos tinham ocorrido à volta
do Mediterrâneo e, a herança humana, era herança da Grécia e de Roma e, quando
fez da viagem dos Argonautas a base da sua cronologia, Newton também deu a
maior ênfase aos acontecimentos bíblicos.
Mas, o que
aconteceu antes dos tempos bíblicos? Hoje poderá surpreender-nos que
poucos cristãos fizessem tal pergunta e, no entanto, para eles a história não
parecia ter significado. O que aconteceu antes da história? Antes de
alguma coisa acontecer, realmente?
Só no século
XIX a palavra “pré-história” entrou nos vocabulários europeus. Entretanto,
pessoas zelosas tinham arranjado maneira de excluir do seu horizonte a maior
parte do passado terrestre.
Juntamente
com as plantas, animais e minerais trazidos para a Europa no regresso das suas
viagens, por missionários e naturalistas, vieram artefatos os humanos –
característica comum das casas dos ricos e poderosos.
Na Idade
Média esses curiosos objetos tinham sido expostos em igrejas, mosteiros e
universidades e, no Renascimento, coleções reais, presentes de embaixadores e
obras de artistas, adornavam os palácios dos Papas. Assim nasceram as grandes
coleções do Vaticano, do Louvre em Paris, do Escorial em Madri, as quais se
destinavam a deleitar uma minoria privilegiada.
O século
XVIII, na Europa, viu nascer um novo gênero de coleção: _ o museu
público. O Governo Britânico foi pioneiro, adquirindo as coleções de
Sir Hans Sloane em 1753 e expondo-as ao público.
Algumas
coleções particulares – como os Museus do Vaticano – foram voluntariamente
expostas ao público. Outras como o Louvre, foram apreendidas por
revolucionários para uso de todos os cidadãos.
Em toda
Europa, um novo público de museus desejava aprender e divertir-se. A palavra “tourist”
entrou na língua inglesa de pois de 1800, a fim de significar a comunidade
móvel de espectadores transitórios.
Na Ásia, as
grandes coleções se mantiveram nas cortes dos príncipes ou foram para as
capelas dos templos e, somente as revoluções, colocariam esses tesouros ao
alcance dos olhos do público. Das terras conquistadas – Egito, Grécia, Roma e
Pérsia – foram transportadas para os grandes museus de Londres, Paris, Amsterdã
ou Berlim obras de pintura, escultura e até edifícios inteiros.
À medida que
os museus europeus cresciam, começaram a mostrar apenas o tipo de objetos que
os aristocráticos tinham colecionado por uma questão de prestígio.
A ênfase era
dada aos belos objetos e aqueles que não eram belos ou estranhos despertavam
pouco interesse. No entanto, foram esses toscos objetos anônimos que abriram as
portas da Pré-História e deram ao público um novo vocabulário para toda a
história.
Uma série de
coincidência deu o principal papel desta descoberta a Christian Thomsen, um
dinamarquês sem erudição que tinha bom senso e era dotado com as virtudes amadoras
de um devoto. À sua paixão por objetos curiosos juntava-se um talento para
despertar a curiosidade do novo público dos Museus.
Treinado para
os negócios, Thomsen travou conhecimento com a família de um cônsul que
prestava serviço em Paris durante a Revolução Francesa e levara para a
Dinamarca as coleções que adquirira da aristocracia em pânico. Quando o jovem
Thomsen ajudou a desencaixotar seus tesouros, o cônsul deu-lhe algumas moedas
antigas para começar a sua própria coleção e foi assim que, aos 19 anos, ele já
era um respeitado numismata.
A Comissão
Real para a Conservação das Antiguidades Dinamarquesas estava inundada por uma
miscelânea de objetos antigos enviados por cidadãos dotados de elevado espírito
público. O idoso secretário não estava à altura do amontoado de coisas que ia
se acumulando e chegara o momento de confiar essa tarefa ao jovem Thomsen –
então com 27 anos – conhecido pela sua organizada coleção de moedas.
Como se
verificou, a sua falta de estudos acadêmicos deu-lhe a inocência de que a
arqueologia necessitava nesse momento. Quando abriu o seu museu em 1819, os
visitantes viram os objetos repartidos em três (3) armários, onde o primeiro
continha objetos de pedra, o segundo de bronze e o terceiro de ferro.
Esse
exercício de administração museológica levou Thomsen a suspeitar de que os
objetos feitos de materiais similares poderiam ser relíquias da mesma era. À
sua visão de amador pareceu que os objetos de pedra deveriam ser mais antigos
do que os objetos de metal, e que os de bronze deveriam ser mais antigos do que
os de ferro.
Thomsen
demonstrou o que se podia aprender não apenas com as esculturas antigas, mas
até com os simples utensílios e as toscas armas dos homens pré-históricos
anônimos. Expondo as suas coleções pata todos, proferiu discursos sobre a
experiência de pessoas do passado remoto.
Orador hábil,
escondia qualquer pequeno objeto interessante atrás das abas da casaca e, de
repente, mostrava-o no momento da sua história em que esse tipo de objeto de
bronze – ou de ferro – aparecia na história.
Não foi fácil
ajustar o esquema das três idades em todo o passado humano na Europa, pois a
chamada “Idade da Pedra” do museu de Thomsen era representada por artefatos de
pedra polida do gênero que as pessoas se sentiam tentadas a enviar-lhe como
curiosidades.
Entretanto,
Worsaae ([1]) sugeria que a Idade da Pedra era muito
mais extensa e antiga do que indicavam esses instrumentos de pedra habilmente
polidos. Nas escavações cada objeto desenterrado podia ser estudado não como
uma curiosidade, mas entre todos os restos de uma comunidade da Idade da Pedra
e também poderiam proporcionar pistas para outras comunidades da Idade da Pedra
em todo o Mundo.
A
oportunidade de Worsaae surgiu em 1849, quando um rico holandês (Olsen) –
chamado para construir uma estrada – mandou seus trabalhadores em busca de
cascalhos para servir de material de superfície.
Encontraram
ossos de animais e sua atenção foi atraída para um pequeno objeto de osso no
formato de uma mão com quatro dedos, o qual era inequivocamente obra de um
trabalho humano feito para servir de pente.
Olsen, que
compartilhava o interesse pelas antiguidades que Thomsen estimulara, enviou o
tal objeto para o museu de Copenhagen. Worsaae verificou que todas as conchas
tinham sido abertas, o que não teria acontecido se tivessem sido levadas para
aquele local pelas águas da margem.
Mas, quando
outros entendidos discordaram, a Academia de Ciência Dinamarquesa nomeou
Worsaae e alguns geólogos para interpretar aqueles jazigos de conchas
encontradas. A comissão concluiu que eram realmente “restos de cozinha”, o que
significava que, pela primeira vez o historiador podia penetrar na vida
quotidiana dos povos antigos.
Thomsen e
seus colaboradores do museu tinham feito tão bem o seu trabalho de publicitar a
arqueologia, que a questão levantada – se a Idade da Pedra devia realmente ser
dividida em 2 estádios claramente definidos – deixou de ser um enigma arcano
reservado a professores universitários.
Worsaae se
tornou professor de Arqueologia em Copenhagen e depois sucedeu a Thomsen como
diretor do museu, sendo chamado de “o 1º arqueólogo profissional do mundo”. Ele
enalteceu o sistema das três (3) idades de Thomsen como “o 1º raio claro
lançado sobre o negrume pré-histórico universal do Norte e do Mundo, em geral”.
A primeira
descoberta da comunidade de toda experiência humana em eras e épocas fez-se
quando a “pré-história” foi analisada e dividida (como uma oração gramatical)
nas três (3) idades: _ Pedra, Bronze e Ferro.
E à medida
que Worsaae explorou as fronteiras entre essas três idades, suscitou algumas
questões explosivas para os cristãos fundamentalistas e, uma delas, foi o
problema ainda agitado por antropólogos: _ a invenção independente ou a difusão
cultural¿
O conceito
perturbador – sugerido por pensadores ousados – de que os homens existiam muito
antes da dará bíblica da Criação, em 4004 a. C. – começou a ser aceito pela
comunidade científica. Mas, a antiguidade remota do homem foi popularizada pela
descoberta não pela descoberta de um tema vasto e inegável, a Pré-História.
Mais do que
uma teoria, os próprios artefatos pareciam testemunhar a cronologia de
pré-história que era um argumento demonstrativo da evolução da cultura humana.
A
Pré-História entrou no currículo da instrução pública, juntamente com as ideias
associadas de evolução. O discípulo e principal divulgador de Charles Darwin
(John Lubbock) conquistou sua reputação na Europa ao ajustar a Pré-História à
evolução.
Os seus “Pre
Historics Times” que criaram as palavras “Paleolítico” e “Neolítico” para
a “Idade da Pedra Polida”, foram muito lidos por leigos, os quais absorveram a
pré-história e evolução numa única leitura deleitosa.
As três
idades, as fases mundiais da pré-história, tornaram mais fácil imaginar outras
épocas que transcendiam a cidade, a região ou a nação. Ao definir latitudes da
história, o homem alargou a sua visão do passado e do presente do Mundo.
A invenção
das grandes “eras”, “épocas” ou “idades” históricas que ultrapassaram limites
políticos proporcionaram receptáculos de tempo suficientemente amplos para
incluírem todos os dados das comunidades de cultura do passado, mas ao mesmo
tempo suficientemente pequenos para permitirem uma definição persuasiva.
Portanto,
poucos outros conceitos fizeram tanto para desprovincializar o pensamento
humano e, esses conceitos, foram para o tempo o que as “espécies” eram para a
Natureza, um modo de classificar a experiência para a tornar útil. Foram a
taxonomia da história.
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