Qual a Importância dos Mosteiros e Albergues nas Ideias Sobre a Terra? Qual Foi a Contribuição do Papa Urbano II Para a Geografia Terrestre? Por Que os Cruzados Constituíram um Dos Movimentos Mais Indisciplinados da História?
A mesma fé
que fanatizava a paisagem e aprisionava os cristãos na Geografia dogmática
haveria de atrair peregrinos e cruzados da Europa para caminhos de descoberta
do Oriente.
A Estrela de
Belém que atraiu os Três Magos, guiou em séculos posteriores incontáveis fiéis
para sua Terra Santa. A peregrinação se tornou uma instituição
cristã e caminhos de fé se tornaram caminhos de descoberta.
Um século
após a morte de Jesus um punhado de crentes viajava para Jerusalém a fim de
pisar a terra que o seu Salvador pisara. Após o imperador Constantino se tornar
cristão, sua mãe que se tornara arqueóloga, foi a Jerusalém, encontrou o Monte
Calvário onde reuniu fragmentos da Verdadeira Cruz e até descobriu o Santo
Sepulcro, onde Jesus fora alegadamente sepultado.
No início do
século V havia 200 mosteiros e albergues para peregrinos nas imediações de
Jerusalém. Santo Agostinho advertiu de que o turista cristão à Terra Santa
poderia ser desviado da sua viagem, embora o fluxo de peregrinos tenha
aumentado ajudado por incontáveis guias e uma cadeia de alojamentos
hospitaleiros ao longo de todo o caminho.
O declínio do
Império Romano do Ocidente e o aparecimento de piratas tornaram difícil e
perigosa a vida dos peregrinos. As extensas conquistas árabes à volta do
Mediterrâneo, o advento do Islã e o aumento dos peregrinos muçulmanos
congestionaram os caminhos da peregrinação cristã e originaram uma implacável
disputa por Jerusalém.
Algumas
tradições muçulmanas consideravam Jerusalém – e não Meca – o “umbigo” da Terra
e, quando o Califa Omar entrou numa Jerusalém rendida seis anos após a morte de
Maomé, iniciou uma batalha milenar pela posse dos lugares santos.
Santiago de
Compostela (Espanha) tornou-se “lugar santo” por causa da descoberta ali feita
no ano de 810 do corpo de São Tiago, que se pensava ter sido executado em
Jerusalém e presumivelmente lá enterrado.
Considerava-se
que Carlos Magno se contava entre os primeiros peregrinos que tinham partido de
toda Europa e, quando os Mouros conquistaram a Espanha para o Islã, surgiu o
culto de S. Tiago – o “matador de mouros”.
O grande imã
para os peregrinos na Europa era Roma, onde Beda (em 735) narrou a viagem de
homens e mulheres bretões que ansiavam por passar algumas horas da sua
peregrinação terrena na vizinhança de lugares santos.
Daí, talvez
tenha derivado o verbo inglês “to roam”. O fluxo de peregrinos
da Inglaterra (e de outros lugares) viria a se alargar depois do malogro da
tentativa dos Cruzados em reconquistarem Jerusalém.
Quando Urbano
II se tornou Papa em 1808 a Igreja sentia muita necessidade de reforma, pois
havia corrupção pela compra e venda de indulgências e cargos eclesiásticos. Reformador
que não se compadecia com a corrupção, Urbano utilizou seus talentos
de organizador e a sua eloquência para purificar e sarar a Igreja.
Aleixo –
imperador oriental – vendo a capital da sua Bizâncio ameaçada pelo Islã, mandou
enviados a Urbano solicitando auxílio militar e, o energético Papa viu nisso
uma oportunidade para unir as Igrejas do Oriente e do Ocidente.
Assim, para
libertarem os lugares santos, os cristãos partiram para o Oriente em agosto de
1096. Deus seria o seu guia, a cruz branca o seu símbolo e os seus bens
ficariam sob a proteção da Igreja. Com esta chamada ás armas, o Papa Urbano
congregou as forças da Europa cristã para transformar peregrinos em Cruzados e,
enquanto a peregrinação era apenas uma pequena viagem de um indivíduo, a
Cruzada seria uma peregrinação maciça.
Sendo assim,
as pessoas em marcha não puderam deixar de ser consideradas descobridoras. Mas,
na sua maior parte, não encontraram o que iam procurar e encontraram muito mais
o que não tinham imaginado.
Os Cruzados
constituíram um dos movimentos mais variados e indisciplinados da história.
Pedro, o Eremita, foi um presságio de coisas que iriam acontecer. Ele ganhou
esse apelido por usar uma capa de eremita, embora fosse uma pessoa que adorava
multidões e sabia influenciá-las.
Criou um
corpo de agentes recrutadores e formou um exército heterogêneo de peregrinos na
França. Quando chegou à Colônia (Alemanha) em abril de 1096 cerca de 15 mil
peregrinos de todas as idades, tamanhos e sexos tinham aderido ao seu grupo.
A chegada da
horda de Pedro a Constantinopla gerou complicações, pois o grupo de Walter (o
Pobre) se uniu a ele e avançaram até a Cidade Santa, pilhando por onde
passavam. Saquearam aldeias, torturaram seus habitantes e assassinaram bebês em
espetados na fogueira.
O imperador
bizantino Aleixo I tentou persuadir aventureiros a submeterem-se ao seu
comendo, mas os mais ambiciosos pilharam para fundar novos reinos. Estas forças
cristãs derrotaram os Turcos e entraram triunfalmente em Jerusalém em julho de
1099, terminando assim a 1ª Cruzada.
Jerusalém foi
transformada rapidamente em um novo reino romano que, de início, tratou-se de
um movimento desordenado que durou dois séculos para tornar-se o caminho dos
peregrinos.
Mas, em um
aspecto tratou-se também do fim das Cruzadas, pois foi a última expedição
coroada de êxito para redimir os lugares santos. Posteriormente, as Cruzadas
apenas ajudavam os cristãos já estabelecidos no Oriente e, após a queda de
Jerusalém nas mãos de Saladino em 1187, os lugares santos mais acessíveis do
Ocidente passaram a atrair cada vez mais os peregrinos.
Depois
que as Cruzadas terminaram as peregrinações continuaram sendo uma força viva da
cristandade europeia e, para muitos, Roma acabou substituindo Jerusalém. Em
1300, o Papa Bonifácio VII proclamou o 1º Ano Jubilar, quando ofereceu
indulgências especiais aos fiéis que visitassem Roma e atraiu assim mais de 20
mil peregrinos.
No Islã, a
peregrinação sempre foi um dever sagrado, pois todo muçulmano era obrigado a
visitar Meca pelo menos uma vez.
Meca foi um
centro de peregrinação de idólatras árabes bem antes de Maomé e, para lá, iam
aqueles que queriam fazer seu festival anual, além de dar boas-vindas
ao ano que se renovava. Meca jamais deixou de ser a meta dos peregrinos
muçulmanos e se transformou num sinônimo de qualquer meta de peregrinação.
Também na
Ásia, multidões de fiéis descobriram o seu próprio mundo. Ninguém sabe
exatamente como, por que ou quando a cidade de Benares – a mais antiga do
Mundo, segundo alguns – se tornou sagrada, mas no século VII já possuía cerca
de 100 templos.
Os budistas
também ensinavam que o Parque dos Veados – em Sarnath, onde Buda pregara seu 1º
sermão – era um degrau para o Céu. O imperador indiano Asoka conduziu
peregrinações a todos os lugares sagrados budistas e, enquanto os visitava,
reparava antigos santuários (as stupas) e construía novos.
A Índia se
tornou uma terra de lugares sagrados e, segundo Buda, “todas as montanhas,
rios, lagos e templos dos deuses são lugares que destroem o pecado”. Dessa
forma, multiplicaram-se os cultos de espíritos locais e incontáveis
sacerdócios.
O malogro das
Cruzadas foi uma bênção para a cristandade e um catalisador da descoberta
europeia do mundo oriental. A grande instituição internacional organizadora do
Islã continuava a ser a peregrinação, que continuou a reunir-se em Meca,
familiar bastião árabe-muçulmano.
Mas não havia
nenhum lugar que correspondesse ao retorno dos peregrinos; ou seja, nenhum
local acessível de regresso indispensável para todos os cristãos.
Daí, sem
nenhuma perspectiva de reconquistarem Jerusalém e os caminhos que lá levavam, a
cristandade ocidental voltou-se para as missões. A peregrinação reunia os
fiéis, mas as missões estendiam os braços para o desconhecido, mesmo nas terras
desconhecidas. Assim, a história da expansão do Cristianismo foi uma história de
missões.
Claro que o
Islã – começando pelo próprio Profeta – era uma religião com grande vigor
proselitista e cada muçulmano era declarado um missionário. Mas, as missões
nunca foram tão bem organizadas nem largamente difundidas como as do
cristianismo.
No Islã, o
peregrino permaneceu um devoto da fé, cumprindo a viagem ritual prescrita a um
destino sagrado conhecido. Na moderna linguagem da cristandade um peregrino ia
a caminho de um estado misterioso de futura felicidade.
Nenhum comentário :
Postar um comentário