De Que Forma os
Marinheiros da Antiguidade Procuravam Coordenadas no Céu? Por Que Galileu
Inaugurou Uma Nova Era no Registro do Tempo? Como se Resolveu o Problema da
Longitude?
Em 1583, ao assistir à missa na Catedral
de Pisa, Galileu Galilei ficou distraído pela oscilação do candeeiro suspenso
do altar. Ele observou que, por mais largo que fosse o balanço desse candeeiro,
parecia que o tempo que levava para oscilar de um lado para outro era sempre o
mesmo, pois ele controlava-o pelo seu próprio pulso.
Essa descoberta abriu uma nova era no
registro do tempo, uma vez que 30 anos após a morte de Galileu o erro médio dos
melhores mecanismos de medição do tempo fora reduzido de 15 minutos para apenas
10 segundos.
Um relógio que mantivesse o passo
certo com outros relógios em qualquer lado transformava o tempo numa medida que
transcendia o espaço. Moradores de Pisa poderiam saber que horas eram em
Florença ou Roma no mesmo instante.
Uma vez sincronizados eles permaneciam
sincronizados e, daí em diante, o relógio se tornou um metro universal. Assim
como a hora igual padronizara as unidades de dia e noite, de Verão e Inverno em
qualquer cidade, agora o relógio padronizava as unidades de tempo em todo o
planeta.
Algumas peculiaridades do nosso
planeta tornavam essa magia possível. Em virtude de a Terra girar sobre seu
eixo, todos os lugares do mundo têm um dia de 24 horas por cada volta completa
de 360º. Os meridianos de longitude assinalam esses graus e, à medida que a Terra
gira, leva meio-dia a diferentes lugares.
Quando é meio-dia em Istambul ainda
são 10 horas a ocidente (Londres) e, em uma hora, a Terra gira 15º.
Consequentemente, podemos dizer que Londres está a 30º de longitude, ou 2 horas
a ocidente de Istambul, o que torna esses graus de longitude uma medida de
espaço e tempo.
Se você for um viajante e quiser
saber exatamente onde se encontra, certamente você achará isso muito mais
difícil no mar do que na terra. Na terra você poderá orientar-se pelas
montanhas, rios, edifícios e cidades. Mas, as referências marítimas são
disponíveis apenas aos observadores especializados.
O vazio e a imensa mesmice dos
oceanos levaram os marinheiros a procurar coordenadas no céu, no Sol, na Lua,
estrelas e constelações. Dessa forma, não nos admira que a Astronomia se
tornasse a “criada dos marinheiros” e, com a ajuda do recém-inventado
telescópio e com as novas visões da Lua por Galileu, os homens descobriram os
mares, fizeram cartas dos oceanos e definiram novos continentes.
Dessa forma, quando o homem decidiu
explorar os oceanos, achou necessário conhecer o céu. Tinha de se localizar em
latitude a norte ou ao sul do equador e em longitude (a leste ou oeste) de
algum ponto. Mas, era muito mais difícil determinar a longitude (as relações
Leste-Oeste) do que a latitude, o que nos ajuda compreender por que o Novo
Mundo esteve tanto tempo por ser descoberto e por que o Oriente e o Ocidente
estiveram tanto tempo separados.
Definir a latitude é mais simples
porque a altitude do Sol acima do horizonte é um fator preponderante. No
equador (em todas as estações do ano), ao meio-dia o Sol estará diretamente
acima ou à altitude de 90º, enquanto no Polo Norte o Sol é totalmente invisível
no Inverno e sempre visível no Verão.
Navegadores perceberam como sabiam
pouco sobre o planeta, pois eles tinham de resolver o problema da longitude.
Galileu tomou conhecimento dessa necessidade dos marinheiros e em 1610 sugeriu
que a longitude poderia ser determinada no mar através da observação dos quatro
satélites de Júpiter.
Mas, isso exigia observações por
longos períodos em um telescópio apoiado no convés de um navio em alto mar – o
que obviamente tornava-se impossível. Imaginou então um telescópio fixado no
capacete e, embora esse método tenha tido sucesso entre os agrimensores em
terra, nunca funcionou no mar.
Daí, antes de haver um relógio de
navegação exato, os marinheiros que quisessem saber suas coordenadas tinham de
ser um matemático experiente. A forma de calcular a longitude no mar passava
por observações precisas da Lua, o que exigia sofisticados instrumentos e
cálculos sutis. Um simples erro de 5º na observação da Lua equivaleria a um
erro de 2,5º de longitude, o que poderia representar cerca de 150 milhas no
oceano.
Isso tornava a longitude um problema
educacional e tecnológico, quando as grandes nações navegadoras acabaram
organizando cursos de matemática para simples marinheiros. Quando Carlos II
instituiu um desses cursos para 40 alunos, os professores tiveram dificuldades
em contentar marinheiros e matemáticos.
Os administradores da escola, observando que os muitos navegadores tinham passado bem sem matemática, perguntavam se os futuros marinheiros precisariam realmente dela. Do lado dos matemáticos, Sir Isaac Newton argumentava que a antiga norma do pouco mais ou menos já não chegava.
Porém, os cálculos para determinar a
longitude baseado na Lua eram bem complicados e era preciso descobrir um método
– de preferência, uma máquina – a fim de permitir às tripulações
semialfabetizadas saber as coordenadas. Em 1604, o rei Felipe III (da Espanha)
ofereceu um prêmio a quem apresentasse uma solução e, mais tarde, Luís XIV
(França) ofereceu 100 mil florins.
Na Inglaterra, o impulso de resolver
o problema da longitude não veio da necessidade dos marinheiros, mas de uma
catástrofe evitável ocorrida na costa sudoeste, Em 1707, uma esquadra inglesa
naufragou nas rochas das Ilhas Scilly e no apogeu da navegação britânica, a
perda de tantos marinheiros tão perto da pátria foi humilhante.
A opinião pública ficou abalada. Dois
matemáticos declararam que o naufrágio poderia ter sido evitado se os
marinheiros não ignorassem sua longitude. Portanto, era necessário descobrir
uma maneira de calculá-la que fosse fácil de compreender por marinheiros
comuns, sem a necessidade quaisquer cálculos astronômicos.
Em 1736, no manicômio Hogarth
(Inglaterra) um internado tentou resolver esse quebra-cabeças e uma das
propostas consistia em localizar navios afundados em posições conhecidas do
mundo e depois enviar sinais deles. Outra proposta era a de publicar uma tabela
à escala mundial das marés e utilizar um barômetro para que o marinheiro
pudesse situar sua posição pela esperada subida e descida nesse lugar
particular. Outra ainda sugeria que se utilizassem faróis para projetar para as
nuvens os necessários sinais luminosos de tempo.
Era evidente que o prêmio não poderia
ser ganho por um relógio de pêndulo e escape acionado por
pesos. Para manter o ritmo medido em um barco que subia, descia e oscilava era
necessário resolver o problema de outra forma; isto é, o relógio deveria ser
livre de pesos e de pêndulos.
Um relógio para navegar teria de ser
independente da gravidade não só quanto à força motriz, mas quanto ao seu
regulador. Se a força de uma mola podia ser utilizada para acionar o relógio,
não poderia o ressalto e a elasticidade de uma mola ser também usada em lugar
de um pêndulo, a fim de regular o mecanismo? Essa foi a ideia de Robert Hooke.
Antes de completar 10 anos, Hooke viu
um relógio desmontado e construiu um – de madeira – para si próprio. No colégio
aderiu ao grupo de debates científicos de que fazia parte o economista William
Petty e o físico Robert Boyle. Hooke construía as máquinas para experimentar as
teorias desenvolvidas pelos cientistas e, quando a Royal Society o escolheu
para curador de experiências, ele pôs em prática as experiências sugeridas
pelos membros da sociedade.
Em 1658 Hooke conjecturava que o
regulador de um relógio marítimo poderia ser feito pelo emprego de molas em vez
de gravidade, para um corpo vibrar em qualquer postura. Uma mola ligada a uma
corda de balanço podia fazer a roda oscilar de um lado para outro à volta do
seu próprio centro de gravidade, gerando assim o movimento necessário para
parar e pôr a trabalhar os mecanismos do relógio e, desse modo, marcar as
unidades de tempo. Esta percepção tornaria possível o relógio marítimo.
Uma das utilizações mais eficazes dos
fundos públicos para o progresso da ciência foi o prêmio que o Parlamento
Britânico anunciou em 1714, como recompensa da descoberta de uma maneira de
calcular a longitude no mar. O vencedor foi John Harrison, filho de um
carpinteiro que, após repetidos esforços, obteve êxito.
Em 1761 o seu modelo correspondeu ao
que se exigia, pois em uma viagem de 9 semanas à Jamaica seu relógio perdeu
apenas 5 segundos – cerca de 1,24 minutos de longitude – o que estava
perfeitamente dentro da margem de longitude exigida pela Junta da Longitude.
Assim, até serem construídos relógios
marítimos mais baratos, os comandantes dos navios continuavam a utilizar o
método lunar, embora em longo prazo fosse mais fácil fornecer relógios baratos
do que formar marinheiros matematicamente instruídos. Não seriam apenas os
marinheiros que teriam acesso ao tempo, pois o relógio marítimo de Harrison era
na realidade um relógio portátil grande. Portanto, o novo conceito de tempo
trazido por esse modelo preencheria todos os interstícios da vida das modernas
sociedades.
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