quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Os Caminhos Para a Evolução Humana

 

Por Que o Pensamento Evolucionista Passou a se Chamar “Darwinismo”? Quem Foi Coautor da Ideia da Seleção Natural? Qual Foi a Importância de Alfred Russel Wallace Para o Darwinismo?

 

 


 

Quando o jovem Darwin iniciou em Dezembro de 1831 a viagem de cinco anos no Beagle, levou consigo o recém-publicado “Princípios da Geologia”. O livro de Charles Lyell forneceu a base para todo o pensamento de Darwin a respeito dos processos da Natureza e, dessa forma, tornaria possível que o pensamento evolucionista moderno se chamasse “darwinismo”.

A intuição de Lyell, documentada no seu livro, levava-o a afirmar que a Terra foi moldada desde o princípio por forças uniformes ainda ativas – erosão por água corrente, acumulação de sedimento, sismos e vulcões. Como, ao longo dos milênios, essas forças tinham feito da Terra o que ela era, não havia necessidade de imaginar catástrofes e, sendo assim, essa doutrina se tornou conhecida como “uniformitarismo”.

Lyell tentou evitar as escolhas da teologia e da cosmologia recusando-se a discutir as origens da Terra e, além disso, ele dizia que teorias especulativas de uma criação eram desnecessárias e não eram científicas. As implicações no que se referem a plantas e animais eram óbvias e se a atividade presente no vulcão Vesúvio explicava mudanças na superfície da Terra, não poderiam outras forças igualmente visíveis mostrar-nos como as espécies e as variedades de plantas e animais tinham surgido? O professor de Botânica de Cambridge que deu a Darwin o livro de Lyell avisou-o de que não deveria acreditar em tudo quanto nele se dizia.

Na história de mistério de como Darwin chegou aos seus conceitos de evolução, a viagem do Beagle foi um episódio crucial. Elo essencial na cadeia de pessoas e ideias foi John Stevens Henslow, o professor que primeiro inspirou Darwin a estudar a Natureza. A realização histórica de Henslow constituiu em transformar Darwin – o playboy de Cambridge – de um indiferente estudante de Teologia em um Naturalista apaixonado.

Em 1831, quando o almirantado pediu a Henslow que lhe recomendasse um naturalista para servir no Beagle, a fim de mapear as costas da Patagônia, da Terra do Fogo, do Chile e do Peru, ele recomendou o seu aluno favorito. Charles estava ansioso por aceitar, mas seu pai, irritado com o seu falso começo do estudo de Medicina, opunha-se a mais aventuras do gênero. Estava decidido a manter o errante Charles no caminho do clero e, o filho obediente, não aceitaria o lugar no Beagle sem a autorização do pai. Felizmente o professor Henslow convenceu o pai a deixá-lo ir.

Henslow manteve contato com o aluno durante a viagem, encarregando-se dos espécimes que Darwin mandava para Londres. Quando o Beagle chegou a Montevidéu, aguardava-o um exemplar do segundo volume de Lyell e em Valparaíso Darwin recebeu o 3º volume, acabado de sair do prelo. Durante toda a viagem, Darwin aplicou os princípios de Lyell.

O 2º volume de Lyell ia além da Geologia Física e, ao longo do tempo geológico, tinham emergido novas espécies e sido extintas outras. A sobrevivência de uma espécie dependia de certas condições de seu ambiente e, o êxito de uma espécie próspera, poderia acarretar a extinção de outras. O estudo de Lyell da distribuição geográfica de plantas e animais indicava que cada espécie surgira num centro, concluindo que ambiente e espécies fluíam juntos.

O impressionável Darwin sentia-se fascinado com as sugestões de Lyell e, por toda a parte da América do Sul, encontrou plantas e animais que nunca vira antes. Nas Galápagos, foi atraído pelas variadas espécies de aves em ilhas separadas umas das outras, mas na mesma latitude. Entretanto, Henslow se sentiu tão impressionado com as cartas de Darwin que mandou imprimir diversas para distribuí-las. Quando o Beagle regressou (em 1836), Henslow colaborou com Lyell a fim de conseguirem uma bolsa de mil libras para ajudar Darwin a compilar seu relatório e, depois disso, conseguiram que ele fosse eleito secretário do Geological Society de Londres.

Alfred Russel Wallace, que a história reconheceria como coautor da ideia da seleção natural, contrastava com Darwin. Oriundo de uma família empobrecida, frequentou um liceu durante alguns anos e aos 14 instruiu-se pela leitura. Ele frequentou um clube de trabalhadores para professores progressistas, onde se converteu ao socialismo. Mantinha-se trabalhando como aprendiz de agrimensor com o irmão e depois leu, sozinho, o suficiente para se qualificar como professor.

Leitor voraz, o jovem Wallace descobriu um inspirador conjunto de livros sobre ciência, história natural, viagens e o dicionário de Darwin no Beagle. Uma das obras que mais o impressionou foi um livro sobre a evolução de outro naturalista – Robert Chambers.

A narrativa pessoal de Alexander von Humboldt das suas viagens ao México e a América do Sul encorajou Wallace a convencer Bates a participarem de uma expedição a fim de reunir espécimes ao longo do Amazonas. Quatro anos depois, isso proporcionou ao jovem Wallace a reputação de “naturalista de campo”. Ao regressar à Inglaterra, o seu navio afundou com seus espécimes, embora isso não o tivesse desanimado a continuar recolhendo outros. Sendo assim, ele partiu imediatamente para o arquipélago Malaio e, nas Molucas, passou oito anos explorando e reunindo novos espécimes, quando formulou a teoria da seleção natural no ensaio que Darwin recebeu em princípios de 1858.

Dessa forma, se um dramaturgo grego tivesse inventado duas personagens para demonstrar como o destino poderia conduzir homens por caminhos opostos ao mesmo destino, dificilmente teria feito melhor do que inventar Darwin e Wallace. Durante o ano de 1860 as noções elementares da evolução foram publicamente testadas e Wallace dispersou-as pelas mais diversas causas. Ele se converteu ao espiritualismo e, fiel ao seu interesse pelo socialismo, acabou sendo eleito presidente da Land Nationalization Society e foi um defensor dos direitos das mulheres. Curiosamente, a sua paixão pela polêmica arrastou-o para o movimento contra a vacinação antivariólica.

Wallace também estendeu seus interesses ao espaço exterior. O eminente astrônomo Percival Lowell argumentava que deviam ter existido habitantes inteligentes em Marte, os quais tinham feito os canais agora visíveis, construindo um sistema de irrigação que criava faixas de vegetação cultivada. Apesar de não ser astrônomo e já contar com 84 anos, Wallace entrou na disputa e, no seu livro de 1907 (“Marte é Habitado?”), insistiu que não poderia existir vida em nenhum outro lugar do Universo. E as provas obtidas no século XX demonstraram que o especialista Lowell estava provavelmente mais longe da verdade do que o amador Wallace.

Os fatos da distribuição geográfica que provocaram interrogações no cauteloso Darwin forneceram respostas ao impetuoso Wallace. Ver a seleção natural afastou Darwin da fé religiosa e, no fim da vida, disse que a grandiosidade da floresta brasileira reforçou sua “firme convicção da existência de Deus e na imortalidade da alma. Mas agora os grandiosos cenários não dariam origem a tais convicções e parece não haver mais propósito na variabilidade dos seres orgânicos e na ação da seleção natural do que na direção em que o vento sopra”.

Mas, a paixão de Wallace pela evolução conduziu-o cada vez mais no sentido de uma crença numa “Inteligência Superior”. Precisava de um deus que explicasse o que via na Natureza. Darwin disse a Wallace quando a crítica deste livro aos livros de Lyell, em 1869, pôs a nu a sua fé em Deus, “Espero que não tenha assassinado completamente o seu próprio e o meu filho”.


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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Os Diplomatas Missionários e as Descobertas da Terra

 

 

Qual Foi a Influência de Gengis Khan na Geografia da Terra? Qual o Papel da Mongólia no Descobrimento de Uma Nova Geografia? Por Que Alguns Mongóis se Converteram ao Cristianismo?

 



 Em meados do século XIII as esperanças de converter os Tártaros ao cristianismo foram alimentadas por acontecimentos recentes. A conquista tártara dos turcos muçulmanos transformou os tártaros em aliados da cristandade ocidental e, boatos de que Gengis Khan fora convertido, pareciam confirmados pela notícia de que suas mulheres e mãe tinham abraçado o cristianismo e pelo fato de numerosos cristãos espalhados pelo reino tártaro estarem autorizados a praticar sua religião livremente.

Frades franciscanos se tornaram pioneiros geográficos e, ao mesmo tempo em que Deus mandou os Tártaros para as partes orientais do Mundo, também mandou para o Ocidente os seus fiéis servos a fim de esclarecerem, instruírem e fortalecerem a Fé. Após sua eleição em 1243, o Papa Inocêncio IV organizou a cristandade contra a nova ameaça da invasão tártara.

Ele convocou um Concílio da Igreja a fim de encontrar um remédio para os Tártaros e outros desdenhadores da Fé e perseguidores do povo de Cristo. Inocêncio exortou os cristãos a bloquearem todas as estradas pelas quais os invasores pudessem vir, abrindo trincheiras, construindo muralhas e erguendo outros obstáculos. A própria Igreja contribuiria para o custo dessas despesas.

Ao mesmo tempo, o Papa resolveu cortar o mal pela raiz e enviou um emissário para convencer Khan na Mongólia. Sem se deixar atemorizar pelo fato de nenhum europeu ter ido à capital tártara e regressado para contar que se passara, Inocêncio pôs o seu emissário a caminho em abril de 1245, antes mesmo de o conflito explodir. Sua escolha foi o frade franciscano João Del Pian, que nasceu em Perússia e ocupava seu cargo na Ordem Franciscana de Colônia. Frei João mostrou ser o homem ideal para a missão.

O outro franciscano (Frei Benedito) tornou-se seu companheiro de viagem à Mongólia. Esses dois frades franciscano pioneiros sofreram – na sua jornada através da Europa Oriental e da Ásia Central – as torturas dos fortes ventos, do frio entorpecente, da neve profunda e do forte calor do deserto de Gobi.

Ao longo do caminho, Frei João teve de persuadir seus anfitriões a fornecerem-lhe guias e montarias para apressar a viagem. Em Agosto, quando os 2 chegaram à Mongólia, os chefes tártaros tinham-se reunido para eleger seu novo imperador e, nesse momento, foi dada aos franciscanos a oportunidade de transmitirem a mensagem que traziam do Papa, declarando seu desejo de que “todos os cristão fossem amigos dos Tártaros e, que os Tártaros, fossem poderosos com Deus do Céu”.

Mas, para isso, os Tártaros teriam de abraçar a fé do Senhor Jesus Cristo. O Papa instigava-os a se arrependerem do que haviam feito e a escrever-lhe o que tencionavam fazer a respeito de todos esses assuntos.

Khan correspondeu, fornecendo a Frei João duas cartas para serem entregues ao Papa, embora elas não tivessem muita importância pois o tártaro não se deixou persuadir à fé cristã. Mesmo assim, Frei João não desanimou, pois alguns cristãos lhe disseram que Khan estava prestes a se tornar cristão.




Quando Khan propôs enviar embaixadores ao Papa, Frei João protelou, pois ele receava que os tártaros vissem as desavenças entre os cristãos e que isso o encorajasse a marchar contra eles. Daí, em novembro de 1246, Khan autorizou Frei João a partir.

Mas, este não foi o fim do papel representado por Frei João no encontro do Oriente com o Ocidente, pois quando Luís IX (rei da França) se preparava para ir a Chipre na 1ª etapa da Cruzada, o Papa Inocêncio IV tentou convencê-lo a ficar em França a fim de proteger o reinado contra os Tártaros e, por isso, o Papa enviou os dois experimentados frades a Paris. Porém, nessa missão eles falharam.

Quando o rei Luís partiu em Cruzada levou consigo outro frade franciscano (Frei Guilherme) e, pouco depois de chegar à Chipre, um homem se apresentou como emissário de Khan trazendo a mensagem animadora de que Khan estaria ansioso por fazer uma aliança contra o Islã. Três anos antes, o próprio Khan seguindo o exemplo de sua mãe se tornara cristão – assim como todos os seus príncipes – e, por esse motivo, todos estavam ansiosos a lutar contra os sarracenos.

O rei Luís enviou como embaixador o frade dominicano André de Longumeau, o qual sabia falar arábico. Este esperava ser abraçado e iniciar uma grande aliança, mas o imperador morrera e o império se encontrava nas mãos de uma regente que não era cristã. Esta o despediu rapidamente com algumas cartas insolentes endereçadas ao seu soberano.

A viagem de regresso por terra durou um ano e Frei André trouxe notícias de que os Tártaros tinham fugido há muito da muralha de montanhas (seria a Muralha da China?). Contou que o avô de Khan se convertera ao cristianismo após uma visão em que Deus lhe prometera a supremacia sobre Preste João (seu pior inimigo) e, além disso, trouxe boatos animadores de um chefe mongol que também se tornara cristão.

O rei Luís estava na Terra Santa quando recebeu este relato otimista e tinha de novo a seu lado Frei Guilherme que, pelos padrões da época, estava preparado para essa longa expedição pois tinha vocação para línguas e falava tártaro. Então, rei Luís deu-lhe uma Bíblia, uma quantia em dinheiro, algumas cartas para o Grande Khan e a rainha Margarida deu-lhe algumas vestes religiosas.

Frei Guilherme trouxe para a Europa um tesouro de fatos sobre o lado oposto da Terra. Ele descreveu o curso dos rios Don e Volga, demonstrou que o Cáspio não era um golfo mas um lago e, pela primeira vez na literatura europeia, observou que Catai era a mesma coisa que Seres (descrita pelos romanos como “seda”).

Quando Frei Guilherme recebeu autorização para ir ao encontro do rei em Paris, encontrou o cientista inglês (e franciscano) Roger Bacon que era suspeito de heresia pela Ordem Franciscana. Frei Bacon – que tinha sido confinado a Paris – teve tempo de estudar os relatos de Guilherme e depois incorporou as descobertas deste na enciclopédia que preparou para o Papa Clemente IV. Daí, através das obras de Bacon, as descobertas de Frei Guilherme chegaram ao Ocidente cristão.


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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

O Saber se Tornou Mercadoria

 

Por Que a Prensa se Tornou a Paladina da Liberdade? Qual Livro Foi Considerado o Primeiro Atlas Geográfico Moderno? Por Que os Marinheiros Eram Naturalmente Conservadores na Aceitação de Novas Ideias? Como o Atlas Tornou a Procura de Conhecimentos Num Empreendimento Cooperativo?




Durante a Idade Média a Igreja tinha um poder demoníaco para desvendar o Mundo e difundir o conhecimento de descobertas em embalagens práticas e muitos mapas impressos seguiam para todos os lados. Pelo poder de multiplicar o produto a prensa se tornou uma paladina da liberdade, proporcionando uma variedade de canais e ideias perigosas.

Uma vez feito o trabalho pela prensa, não havia força na Terra capaz de apagar a mensagem. Uma obra impressa posterior podia contradizer a anterior, mas nunca apaga-la. Queimadores de livros e censores sempre travaram uma batalha perdida.

Ao contrário dos manuscritos que exigiam somente pena, papel e tinta, um livro impresso requeria investimento de capital e, além disso, era necessário grande sortimento de tipos e uma prensa. A preparação de uma xilogravura para um mapa impresso era dispendiosa e, por isso mesmo, os impressores de livros e de mapas estavam investindo no futuro. Eles não abandonariam facilmente o seu produto, mesmo que as ideias passassem de moda ou os mapas fossem revistos por novas descobertas.

Os mercadores de mapas tinham um interesse pessoal na informação obsoleta. A sede da produção de mapas na Europa se deslocava para o lugar a tecnologia estivesse mais avançada. Depois de 1550, quando os melhores mapas começaram a ser calcogravados ([1]) em vez de xilogravados ([2]), o centro da produção de mapas europeu se transferiu para os Países Baixos, onde havia os melhores gravadores de linhas.

Os marinheiros eram naturalmente conservadores e lentos na aceitação de novas ideias e, além disso, eles relutavam em aceitar um novo continente ou um novo oceano. Entretanto, os portulanos e as cartas de navegar só muito lentamente começaram a ser impressos. No século XVII, os pilotos europeus continuavam a desconfiar das cartas impressas e preferiam as traçadas à mão, porque lhes eram familiares.

Não obstante a relutância dos marinheiros, a feitura de mapas rapidamente se tornou um grande negócio – pelos padrões da época – e, menos de 20 anos depois da Bíblia de Gutenberg, saiu a 1ª edição da volumosa “Geografia” de Ptolomeu, à qual se seguiram numerosas outras. Gerardus Mercator foi o mais influente daqueles que aproveitaram a oportunidade.

Os geógrafos cristãos que colocavam Jerusalém no centro da sua visão do mundo tinham se preocupado mais com guiar os fiéis para a salvação do que ajudar os marinheiros a chegar ao porto seguinte. Mercator transformou o mundo dos mapas, preparou-os para a nova idade secular.

A cosmografia se tornou geografia e a conveniência de mercadores, de militares e de navegadores passou a ser servida não apenas por cartas costeiras, mas também por novas imagens de todo o planeta. O extraordinário feito dele foi a chamada “projeção Mercator”, pois até então os marinheiros tinham dificuldades em traçar suas rotas numa carta porque as cartas não consideravam que a Terra era esférica. Nela, os meridianos convergiam para um ponto nos polos.

Como podia um segmento dessa esfera ser posto num papel para que um marinheiro pudesse traçar o rumo indicado pela bússola em linha reta? Mercator descobriu uma forma de consegui-lo, imaginando as linhas longitudinais como sendo cortes na casca de uma laranja e, depois disso, ele retirou segmentos como se fossem elásticos, esticou as pontas estreitas e alargou-as de forma a transformar cada segmento num retângulo em contato com o seguinte do topo à base. Toda a casca da esfera – que representava a superfície da Terra – se tornou num único retângulo, com meridianos de longitude paralelos uns aos outros do polo norte ao polo sul.

Mercator nos deixou a mais autêntica edição ainda existente dos mapas de Ptolomeu. As edições anteriores deste tinham incorporado as “melhorias” próprias de cada editor e, definindo o que o próprio Ptolomeu descrevera, Mercator demonstrou como essa imagem deveria ser corrigida.

Ele revelou uma espantosa noção moderna da história quando da sua edição de 1578 ofereceu – intatos – 27 dos próprios mapas de Ptolomeu, juntamente com uma versão mais exata do texto da sua “Geografia”. Amigo de Mercator o jovem Abraham Ortelius possuía talento empreendedor e, ao contrário do seu mestre,

Ortelius chegou à cartografia não através da astronomia, mas por ter lidado com mapas como mercadorias. Aos 20 anos já ilustrava mapas a fim de manter a mãe, acabando por se tornar negociante, comprando mapas – que as irmãs montavam em linho – e colorindo-os para vendê-los em Frankfurt.

Com a expansão do seu negócio Ortelius começou a viajar para as Ilhas Britânicas, Alemanha, Itália e França, comprando os mapas locais e vendendo os seus próprios ilustrados. Desse modo, reunia os melhores mapas em uso em toda Europa, os quais levava para sua sede em Antuérpia.

Naquela época, os mercadores de Antuérpia tinham necessidade de mapas confiáveis, dos quais constassem os resultados mais recentes das guerras religiosas e, sem eles, não podiam planejar as rotas mais curtas e menos arriscadas para suas mercadorias.

Um dos empreendedores da época – Aegidius Hooftman – prosperou graças a ter-se mantido bem informado e colecionado as melhores cartas e mapas em uso, de todos os tamanhos. Os mapas grandes só podiam ser utilizados desenrolando-os, mas as letras eram pequenas e por isso tornavam os nomes dos lugares quase ilegíveis.

Sendo assim, Hooftman persuadiu Ortelius a procurar os mapas mais dignos de crédito, com dimensões uniformes. Os mapas escolhidos teriam de ser impressos numa folha de papel com cerca de 70 cm X 60 cm, que era o maior tamanho produzido pelos fabricantes da época. Depois 30 desses exemplares podiam ser unidos e encadernados como um livro, em um formato conveniente para arrumação e fácil para seu uso.

Quando fez isso para Hooftman, Ortelius criou uma nova espécie de livro, o qual foi considerado o primeiro atlas geográfico moderno. A ideia pareceu tão boa que ele preparou mais livros do mesmo gênero para o mercado e, ajudado por Mercator, ele reuniu os melhores mapas reduzindo-os às dimensões padrão e obteve a colaboração de Christophe Plantin, cuja tipografia fazia alguns dos melhores trabalhos da Europa.

O atlas de Ortelius obteve um sucesso comercial imediato e, passados 3 meses, impôs-se a 2ª edição e depois o texto latino foi traduzido para o holandês, alemão, francês, espanhol, italiano e inglês. Ele conquistou fama, fortuna e aconselhou os melhores geógrafos da época na Europa. Depois de atestada sua ortodoxia católica, ele foi nomeado geógrafo do rei Felipe II da Espanha.

O frontispício ([3]) do atlas de Ortelius apresentava pela 1ª vez quatro figuras humanas, uma para cada um dos continentes, que passavam a incluir a África. Os frontispícios das edições de Ptolomeu tinham apenas três – para a Europa, Ásia e outra para a África – e a disposição geral do livro era a “costumada”. Isto é, 1º um mapa do Mundo, depois um mapa de cada continente conhecido e a seguir mapas de países e regiões.

Ainda não totalmente liberto de Ptolomeu, Ortelius continuava a apresentar o lendário continente austral ptolomaico – que se estendia a partir de polo sul – e o reino do irreprimível Preste João. Apesar disso, contribuiu muito para libertar os autores de mapas dos erros mais grosseiros de Ptolomeu.

Assim, o atlas tornou a procura de conhecimentos em um empreendimento cooperativo e, assim como o relógio portátil, o atlas tornou o tempo do mundo acessível a todos, onde milhões de pessoas puderam compartilhar uma visão do espaço do mundo quando eles se tornaram portáteis. Portanto, em função disso, o saber acabou se tornando uma mercadoria. 

 

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([1]) Nome dado as gravuras feitas em metais.

([2]) Arte e técnica de fazer gravuras em relevo sobre madeira

([3]) Em arquitetura, frontispício é um elemento arquitetônico constituído, genericamente, pelos elementos decoradores da parte frontal de uma construção, sobretudo na área da fachada. Sua composição reflete o período histórico da obra arquitetônica, sendo característico de uma escola.



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quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

O Trono Monarquista e a Primeira Constituição Brasileira

 

Quais Eram as Posições dos Monarquistas, dos Liberais, Republicanos, Federalistas, Abolicionistas e Escravagistas na Primeira Constituição Brasileira? Por Que o Imperador Teria de Se Submeter à Constituição?

 



O dia 12 de outubro de 1822 amanheceu chuvoso no Rio de Janeiro, mas nem a chuva nem as rajadas de vento conseguiram atrapalhar a primeira festa cívica do Brasil independente. A cidade foi acordada por uma salva de tiros de canhões, disparada das fortalezas na entrada da baía de Guanabara e dos navios ancorados no porto.

Às nove horas chegaram ao Campo de Santana duas brigadas do exército e, uma delas, comandada pelo brigadeiro José Maria Pinto Peixoto – aquele que o príncipe mandou prender e soltar na viagem a Minas Gerais no começo do ano. O brigadeiro havia se tornado um dos mais fiéis aliados de D. Pedro.

Os moradores colocaram suas melhores roupas e saíram, a janelas para ver o espetáculo. No centro da praça foi erguido um palacete especialmente para a ocasião, ostentando os novos símbolos nacionais criados por decreto imperial. Em verde e amarelo, o escudo das armas e o distintivo combinavam elementos da heráldica portuguesa, como a esfera e a cruz da Ordem de Cisto.

Pedro saiu do Palácio da Quinta da Boa Vista às 10 horas, acompanhado por D. Leopoldina e sua filha mais velha Maria da Glória, de 3 anos. O novo imperador completava 24 anos naquele dia, 15 dos quais havia passado no Brasil. Ao chegar ao Campo de Santana, D. Pedro foi recebido com gritos de vivas da multidão e, depois de subir no palacete, ouviu um longo discurso do presidente do Senado da Câmara – José Clemente Pereira – e aceitou o título de imperador.

O povo reagiu com entusiasmo, sacudindo lenços brancos e as pessoas se abraçavam e choravam e, segundo o pintor Jean-Baptiste Debret, o imperador também chorou. Terminada a cerimônia, Leopoldina e a filha saíram de carruagem e D. Pedro preferiu usufruir a nova condição de herói nacional. Caminhou até a Capela Imperial acompanhado da guarda de honra, juízes, funcionários públicos e pessoas do povo. Ao chegar à Igreja assistiu ao ritual de ação de graça e a etapa seguinte aconteceu no Paço Imperial, onde foi novamente recebido por uma salva de 101 disparos de canhões.

A festa se repetiu no dia 1º de dezembro, data da coroação de D. Pedro. O imperador apareceu sob uma túnica verde, calçando botas de cano longo e usando um manto azul em forma de poncho forrado de cetim e bordado em ouro. Esse dia também era o aniversário da real família de Bragança e foi nessa data – em 1640 – que o 1º rei da dinastia (D. João IV) chegou ao trono português. Aclamado e coroado o imperador, ainda pairavam muitas incertezas no horizonte do novo Brasil. O ambiente estava mais para confronto do que para celebrações.

Na prática, haveria duas guerras em andamento nos anos que se seguiram ao “Grito do Ipiranga” – uma externa e outra interna. A primeira, resultante do choque de interesses entre brasileiros e portugueses, iria se resolver nos campos de batalha e depois em negociações diplomáticas.

A outra seria entre os próprios brasileiros em razão das diferenças de opinião a respeito da forma de organizar e conduzir o novo país. Monarquistas e liberais, republicanos e federalistas, abolicionistas e escravagistas – entre outros grupos – se confrontariam pela primeira vez na Assembleia Geral Constituinte e Legislativa.

Ali apareceram os temas que dominaram a arena política do Primeiro Reinado. A Constituição seria a fiadora de um “novo pacto social”. A agitação tinha como foco os jornais, pois no “Correio do Rio de Janeiro”, o jornalista João Soares Lisboa defendia “Pedro I sem II”. Ou seja, a monarquia seria uma solução transitória. Depois, viria a República.

Convocada por D. Pedro em junho de 1822, a Constituinte só seria instalada 6 meses depois e, entre a convocação e a dissolução, foram 18 meses de tumulto, em que as paixões políticas se expressaram pela 1ª vez de forma desenfreada. As discussões giravam em torno do papel do imperador.

Um grupo sustentava que a legitimidade e o poder do soberano eram delegados pela nação brasileira. O imperador teria de se submeter à Constituição, a ser elaborada pelos representantes do povo. Era o grupo dos democratas, ligados às correntes revolucionárias da maçonaria, como o advogado Joaquim Gonçalves Barbosa, o brigadeiro Domingos Alves Branco Muniz Barreto e o juiz português José Clemente Pereira.

A segunda corrente – dos liberais moderados, do ministro José Bonifácio – defendia que a autoridade do imperador se sustentava por si mesma. Era, portanto, superior à da Constituinte e de todo o restante da sociedade brasileira. A primeira crise da Constituinte irrompeu antes da sua instalação e estava relacionada à chamada cláusula de juramento prévio. O documento propunha aclamar D. Pedro imperador de Brasil em 12 de outubro. Mas, este não seria um soberano qualquer, mas um “imperador constitucional”, o qual teria de jurar a Constituição antes ainda que ela fosse elaborada.



José Bonifácio usou toda sua influência como ministro e chefe da maçonaria para impedir que D. Pedro jurasse – às cegas – uma constituição que ainda não existia naquela época. José Bonifácio revelou-se no poder tão autoritário e conservador quanto o próprio D. Pedro, usando mão de ferro para silenciar adversários, ordenando prisões e deportações de portugueses suspeitos de conspirar contra a autoridade do imperador.

Ameaçados e perseguidos, os radicais abriram mão da cláusula de juramento prévio, mas logo surgiu uma segunda crise relacionada ao direito de veto do imperador. José Bonifácio defendia o veto absoluto, pelo qual D. Pedro poderia anular qualquer artigo da nova constituição. A ala de Clemente Pereira e Gonçalves Ledo discordava.

Um terceiro grupo – mais moderado – propunha o veto suspensivo, pelo qual o imperador poderia adiar por tempo indeterminado a aplicação do artigo com o qual não estivesse de acordo. Causa principal da dissolução da constituinte em novembro de 1823, essa divergência jamais seria superada. Os membros da constituinte eram escolhidos pelos mesmos critérios da eleição dos deputados às cortes de Lisboa.

Os eleitores eram homens livres, com mais de 20 anos, um ano de residência, proprietários de terra e cabia a eles escolher um colégio eleitoral que, por sua vez, indicava os deputados de cada região. Estes tinham de saber ler e escrever e, no caso dos nascidos em Portugal, tinham de residir pelo menos 12 anos no Brasil. Do total de 100 deputados eleitos, só 89 tomaram posse.

Era a elite intelectual e política brasileira, composta de magistrados, clérigos, fazendeiros, senhores de engenho, altos funcionários, militares e professores. Muitos dos eleitos tinham representado o Brasil até um ano antes nas cortes de Lisboa, caso de Antônio Carlos de Andrada, que na constituinte dividiria os assuntos com os irmãos José Bonifácio e Martim Francisco.

A Constituinte funcionava 4 horas por dia, das 10 às 2 da tarde e, num país até então não habituado a propor, discutir e aprovar leis, os trabalhos demoravam a ganhar ritmo. Reclamações, queixas e súplicas choviam de todas a vastidão do Brasil – disse o historiador Otávio Tarquínio de Souza. Com tantos assuntos paralelos, só em 1º de setembro a assembleia conseguiu ler o projeto de constituição que deveria discutir. Não deu tempo, pois nos 2 meses que lhe restavam de vida foi engolfada por um turbilhão de crises.

O gabinete de José Bonifácio caiu em meados de julho e o motivo foi – aparentemente – banal. Luís Augusto May (do jornal Malagueta), que se opunha a D. Pedro, teve a casa invadida por um grupo que lhe aplicou uma surra. O atentado foi atribuído ao grupo de José Bonifácio e, mais tarde, descobriu-se que os responsáveis eram amigos de D. Pedro.

Mesmo assim, o ministro seria demitido em 16 de julho. Na verdade, Bonifácio trombou com os poderosos interesses dos latifundiários ao sugerir à constituinte a proibição do tráfico negreiro e abolição gradual da escravidão no Brasil. Bonifácio cometeu um erro de cálculo, pois acreditou que, uma vez silenciados os radicais republicanos e preservado o poder do imperador, conseguiria avançar nas reformas sociais de que o Brasil tanto necessitava para se considerar uma nação soberana.

Dependente da mão de obra escrava, a aristocracia rural brasileira aceitaria qualquer coisa da constituinte, menos mudanças nas estruturas sociais que sustentava a economia brasileira e garantiam seus privilégios. As horas que antecederam o fechamento da constituinte passaram para a História como “A Noite da Agonia”.

No dia 11 de novembro, os deputados declararam-se em sessão permanente numa tentativa de resistir às pressões de D. Pedro e da tropa que cerava o edifício. Todos passaram a noite em claro e, às 11 horas da manhã seguinte, Francisco Vilela Barbosa – coronel do exército – entrou no recinto fardado e de espada em punho. Duas horas depois chegou um oficial com a ordem do imperador. A assembleia estava dissolvida porque “perjurara ao seu solene juramento de salvar o Brasil”, segundo a justificativa de D. Pedro.

Na declaração de dissolução da constituinte, D. Pedro prometeu dar ao país uma constituição “duplicadamente mais liberal do que o que a extinta Assembleia acabou de fazer”. E foi, de fato, o que aconteceu. A primeira Constituição brasileira outorgada pelo imperador no dia 25 de março de 1824, era uma das mais avançadas da época na proteção dos direitos civis.

Uma de suas novidades era a liberdade de culto. O catolicismo mantinha-se como a religião oficial, mas pela 1ª vez na história brasileira, judeus, muçulmanos, budistas, protestantes e adeptos de outras crenças poderia professar livremente a sua fé. No entanto, a maior de todas as novidades era o “poder moderador”. Exercido pelo imperador, constituía-se como um quarto poder, que se sobrepunha aos outros três poderes – executivo, legislativo e judiciário – e arbitrava eventuais divergências entre eles.

Tratava-se de uma tentativa de reconciliar a monarquia com liberdade, direitos civis e constituição. Na opinião de Benjamin Constant, caberia ao soberano mediar, balancear e restringir o choque entre os poderes. No caso do Brasil, entre as atribuições do imperador estavam a faculdade de nomear e demitir os ministros, dissolver a câmara dos deputados e convocar eleições parlamentares. Entre 1824 e 1889, D. Pedro I e D. Pedro II invocaram o poder moderador 12 vezes para dissolver a Câmara – em média uma a cada cinco anos.

  

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quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

A Primeira Guerra Mundial e o Declínio da Europa

 

Que Regimes Políticos Constitucionais Sustentavam a Europa no Início do Século XX? O Que Era a Tríplice Aliança? Quais os Principais Acontecimentos Que Precipitaram a Primeira Guerra?

 

 


 

No final do século XIX, a Europa brilhava sobre o mundo e vivia-se o apogeu da sociedade liberal. Mas, o apogeu sempre traz o germe da mudança e, esse germe, eram as próprias contradições do sistema capitalista: a miséria do proletariado em meio à abundância, as crises de superprodução, a frenética busca de mercados, os problemas sociais e econômicos.

Todos esses problemas geraram a crise do mundo liberal capitalista, e a Primeira Guerra Mundial marcou o início da crise geral. Mesmo às vésperas do conflito, os homens não acreditavam na possibilidade de uma guerra generalizada e, no máximo, uma guerra rápida e localizada como as ocorridas no século XIX.

Mas, o longo período de paz mantida desde o fim das guerras napoleônicas e o equilíbrio europeu terminava. A Europa não brilhava mais sobre o mundo e os problemas sociais e econômicos se agravavam, pois a classe média se pauperizava e a pressão operária aumentava.

Em meio à guerra, a Revolução Socialista explodia na Rússia e representava uma ameaça para a Europa, e, diante do “perigo vermelho”, surge a questão: _ Como reagiriam os industriais e financistas do mundo capitalista?

 

A Hegemonia Europeia em 1914

 

Apesar do desenvolvimento dos EUA e do Japão, em 1914 a Europa ainda exercia grande supremacia econômica e política sobre o resto do planeta. Supremacia econômica porque controlava a maior parcela da produção mundial, 62% das exportações de produtos fabris e mais de 80% dos investimentos de capitais no exterior, dominando e ditando os preços no mercado mundial. Supremacia política porque na sua expansão o capitalismo europeu levou à necessidade de se controlar os países da Ásia, África, América Latina e Oceania.

Dos 23 Estados europeus, 20 eram monarquias e só a França, a Suíça e Portugal eram Repúblicas. Predominavam regimes políticos constitucionais, mas o parlamentarismo – forma típica do liberalismo político – limitava-se à Grã-Bretanha e à França. Os demais países possuíam formas autoritárias de governo, como a Áustria-Hungria e a Alemanha.

Nos países da Europa Centro-Oriental a nobreza predominava e, na maioria dos Estados da Europa Ocidental, a industrialização colocara frente a frente a burguesia e a classe operária. A ameaça de uma revolução social parecia remota naquele momento porque a maioria dos partidos socialistas tendia à moderação, aderindo ao jogo político do liberalismo. As únicas exceções eram algumas facções de esquerda como os bolchevistas russos.

Só os EUA e o Japão se colocavam fora da influência europeia disputando com o capitalismo europeu “áreas de influência”, pois em 1914, os EUA já se apresentavam como uma potência econômica mundial, controlando pequena parcela do mercado mundial e recebendo investimentos da Europa. E, após sua abertura ao Ocidente, o Japão desenvolveu-se rapidamente passando a integrar-se ao círculo das nações imperialistas e se lançando sobre a China e a Manchúria – na Ásia.

 

Os Choques Internacionais e os Sistemas de Alianças

 

O clima internacional na Europa era carregado de antagonismos que se expressavam na formação de alianças secretas e de sistemas de alianças, tornando a ameaça de uma guerra inevitável. O desenvolvimento desigual dos países capitalistas – a partir de fins do século XIX – levara países que chegaram tarde à competição internacional (como a Alemanha) a reivindicarem uma re-divisão do território econômico mundial.

Cada vez mais aumentou a rivalidade pela luta por mercados consumidores, pela aquisição de matérias-primas fundamentais. Essa rivalidade ocorreu entre as economias das diversas regiões do mundo pela expansão do capitalismo. Daí o caráter mundial do conflito. Havia muitos pontos de atrito entre as potências, tais como:

 

a) O Anglo-Germânico: a Alemanha – unificada tardiamente – já havia desalojado a Inglaterra da sua posição de “oficina do mundo”; entretanto, não possuía colônias, áreas de investimentos e outros mercados correspondentes ao seu poderio econômico, daí a política agressiva expressada também na corrida naval, o que foi considerado uma ameaça à hegemonia marítima inglesa.

b) O Franco-Alemão: Girando em torno da questão da Alsácia / Lorena, territórios franceses anexadas à Alemanha em 1871. Os alemães também se opunham à penetração francesa no Marrocos.

c) O Austro-Russo: Acentuado quando os russos voltaram sua atenção aos Bálcãs; nestes, a política russa foi de apoio à Sérvia, foco de agitação nacionalista anti-austríaca.

d) O Russo-Alemão: Em torno do controle do estreito de Dardanelos, já que a rota do expansionismo russo cortava a do imperialismo alemão (Berlim / Bagdá).

e) O Austro-Sérvio: Nos Bálcãs, a Sérvia fomentava as agitações nacionalistas dentro do Império Austro-Húngaro, sendo constante fonte de atritos; assim aconteceu na crise internacional de 1908, quando a Áustria ocupou a Bósnia-Herzegovina cobiçada pela Sérvia e, em 1912, nova crise quando a Áustria exigiu a independência da Albânia. Foi esse último foco de atrito que provocou o início do conflito em 1914, com o assassinato em Sarajevo.

 

Para sustentar o nacionalismo agressivo e o imperialismo beligerante, os países empreenderam a corrida armamentista, desenvolvendo-se a construção naval e aumentando-se os exércitos; ou seja, criou-se a “Paz Armada”. Essa atmosfera de tensão explica a formação de dois sistemas de alianças. Um, a Tríplice Aliança que agrupava a Alemanha, a Áustria-Hungria e a Itália. O único ponto fraco era a Itália, por ser incerta sua atitude na ocasião de um conflito e também por estar se aproximando das potências da “Entente Cordiale”.

O outro sistema era a Tríplice Entente, formada de uma aliança militar (a franco-russa) e dois acordos (a Entente Cordiale – franco-inglesa – e o Acordo Anglo-Russo). Os vínculos entre tais países eram mais frágeis do que aqueles que entrelaçavam o “sistema alemão”. Tinha contra si a fragilidade social, política e econômica da Rússia, sendo também difícil prever o comportamento da Inglaterra antes de iniciar-se um conflito armado.

O sistema de alianças secretas gerou um mecanismo tal que, bastaria um incidente, para desencadear um conflito generalizado. E foi o que aconteceu em julho de 1914, quando o arquiduque – herdeiro do trono austríaco – Francisco Ferdinando foi assassinado em Sarajevo por um estudante da Bósnia-Herzegovina (província austríaca reivindicada pela Sérvia). E, a partir daí os acontecimentos se precipitaram:

 

·                     A Áustria – apoiada pela Alemanha – enviou um ultimato à Sérvia, o qual não sendo atendido integralmente levou os austríacos a declararem guerra aos sérvios.

·                     A Rússia mobilizou suas tropas em defesa da Sérvia, recebendo um ultimato alemão para se desmobilizar.

·                     Em 1º de agosto a Alemanha declarou guerra à Rússia e, dois dias depois, à França.

·                     A Bélgica foi invadida, ignorando a Alemanha a sua neutralidade, o que levou a Inglaterra a declarar-lhe guerra.

 

Embora pertencesse à Tríplice Aliança, a Itália se omitiu, argumentando que o seu compromisso com a Áustria e com a Alemanha previa sua participação apenas no caso de tais países serem agredidos.



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quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

O Que é Programação Neurolinguística?

 

Em Que Método se Fundamenta a Programação Neurolinguística? Qual é a Razão da Ciência da PNL?




 

 Em um dos raros momentos da História, a humanidade se defronta com o painel de controle da mudança pessoal, com a possibilidade de assumir o controle do modo como ocorre a transformação pessoal. Essa grande transformação não é um novo sistema religioso, científico ou filosófico. É, na verdade, uma nova mentalidade.

 

Para alguns estudiosos em comunicação, a Programação Neurolinguística (PNL) é um método bastante eficaz de adquirir esta nova mentalidade. Ou seja, é um modo de pensar que revela o fato de que qualquer pessoa pode superar seus antigos limites, transpor a inércia, o medo e atingir níveis de realização que antes pareciam impossíveis.

 

John Grinder (linguista) e Richard Bandler (matemático e perito em TI) criaram esse nome para se referirem à “ciência da comunicação compreensiva e útil que produz mudanças positivas e resultados pessoais”. Para eles, a PNL é um novo paradigma da comunicação e do comportamento humano. Seu valor está na capacidade de solucionar os problemas insolúveis da psicoterapia e da estrutura de comunicação interpessoal, os quais nos foram ensinados até aqui.

 

Sendo assim, pode-se dizer que a PNL é um modelo da nossa experiência subjetiva que avalia como essa experiência influencia nosso comportamento e, como tal, ela pode ser considerada a epistemologia – conhecimento à respeito do conhecimento – da experiência. Como ciência aplicada, a PNL oferece procedimentos específicos e eficazes no campo da educação, do treinamento, da administração, dos negócios e da terapia. Ela está alicerçada na linguística transformacional, na cibernética relacional e na neurofisiologia.

 

“A PNL se fundamenta na crença de que existe um enorme potencial no ser humano, o qual ainda é latente e muito além da imaginação das pessoas. E, quando esse potencial é acionado, permite às pessoas controlar suas vidas, seus desejos e dá-lhes o poder da co-criação neste universo” ([1]).

 

 

Qual é a Razão da Ciência da PNL?

 



 A Programação Neurolinguística está amadurecendo em um momento crítico da nossa era, o qual relembra a época das grandes mudanças da Grécia antiga, pois sentimos nossa vida moral ameaçada e a intelectual desafiada pela desintegração dos costumes e crenças passadas, divorciadas dos problemas que hoje nos afligem. Estamos no limiar de um novo paradigma comportamental e a complexidade, a variedade e o ritmo das mudanças atuais não têm precedentes.

 

Ao nosso redor todas as formas estão sendo alteradas, desde os modernos meios de produção e a alta tecnologia até as inovações no relacionamento e na comunicação interpessoal. Ondas de novas sociedades nos atingem cada vez mais rapidamente. A agricultura de quase 6 mil anos foi promovida a indústria; a aldeia transformada em cidade e a cidade em metrópole em menos de 120 anos. Isso elevou a ciência, deprimiu a arte, libertou o pensamento, pôs fim à aristocracia, deu força à democracia, abalou o casamento, quebrou o velho código moral, enfatizou a busca pelo novo e a obsessão pelo rápido.

 

No encalço dos países de 1º Mundo buscamos as regras do novo paradigma da 4ª Onda – a onda da sociedade produtiva –, cujos critérios fundamentais conhecemos como “Qualidade Total”. A nova onda da sociedade produtiva nos ensina a fazer mais, melhor, com menos esforço e, certamente, isso também implica melhoria da qualidade de vida.

 

Nos últimos setenta anos trocamos o campo pela fábrica, pelos escritórios e pelo mundo. A simplicidade dos impulsos foi substituída por experiências intelectuais caóticas e tudo tem que ser exageradamente pensado, a um volume significativo de preocupações, desde a “fórmula” artificial de alimentação de nossas crianças até os erráticos esforços dos governantes em dirigir a economia nacional.

 

Nesse contexto, a PNL se apresenta como um meio de nos colocar em um ponto mais elevado, de onde possamos ter uma ampla visão do conjunto, pois o que perdemos foi a visão e a perspectiva. Perdemos nossos objetivos em longo prazo, em meio à poluição de informações. Dessa forma, precisamos despertar nossos recursos potenciais adormecidos, despertar os poderes de comunicação e de liderança da própria vida e buscar uma unidade entre espírito mente e corpo.

 

Portanto, como um poderoso instrumento de realização pessoal, a PNL proporciona a congruência e o alinhamento de nossos recursos com o propósito de vida, melhorando e potencializando a comunicação e as relações humanas.






([1]) CHUNG, Tom. “Qualidade Começa em Mim: Manual Neurolinguístico de Liderança e Comunicação”. 5ª Edição – São Paulo. Maltese, 1998.



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sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

A Primazia Holandesa na Idade Moderna

Qual Era a Religião Predominante na Europa Durante a Idade Moderna? Qual a Contribuição do Calvinismo Para a Economia Holandesa? Qual a Relação Existente Entre a Burguesia e a Monarquia da Época? Como Ocorreu a Concentração de Poderes nas Mãos dos Reis?


                                                                   


 

Muito antes de se tornar independente, a Holanda já se constituía numa das regiões mais prósperas da Europa, pois sua agricultura progredia e suas indústrias se desenvolviam na produção de linho, lã, tapeçarias e construção naval.

O comércio – beneficiado pelos progressos da marinha – se expandia rapidamente, aproveitando-se das rotas fluviais e marítimas. Com as rápidas transformações econômicas do século XVI, a sociedade assistiu ao fortalecimento da rica e ativa burguesia dos centros urbanos dos Países Baixos, onde o calvinismo se converteu na principal religião.

Mas, a ascensão de Felipe II ao trono espanhol mudou as relações com os Países Baixos, ocorrendo choques contra a intolerância religiosa, opressão fiscal e criação de impostos.

Isso propiciou a divisão dos Países Baixos, onde o Sul permaneceu unido à Espanha e os burgueses calvinistas do Norte formaram uma união com a Inglaterra de Elisabete I. E, apesar de a Espanha só haver reconhecido a independência das Províncias Unidas em 1648, estas já haviam organizado uma república federal, burguesa e calvinista.

Nas Américas, os holandeses se apoderaram da Guiana, da Ilha de Curaçao, diversos pontos da América do Norte e do litoral norte e nordeste do Brasil, durante algum tempo. Na África, se estabeleceram na cidade do Cabo, em Angola e São Tomé. No Oriente, criaram feitorias na Índia. Dominaram Java, Ceilão, Malaca, Nova Guiné e Timor.

Para processar todas essas atividades, eles construíram muitas embarcações e formaram a primeira frota naval do mundo. E, graças a tudo isso, Amsterdã se converteu no principal centro comercial e financeiro da Europa durante a primeira metade do século XVII.

Mas, embora a ascensão holandesa fosse rápida o declínio se precipitou na 2ª metade do mesmo século, pois as desastrosas guerras contra a Inglaterra e França arruinaram o país e reduziram sua participação no comércio mundial.

Na verdade, os holandeses foram incapazes de passar do capital comercial para o industrial, pois as excelentes possibilidades de lucro das transações mercantis desviaram capitais de outras atividades como a indústria, por exemplo.

A burguesia foi a principal financiadora das Grandes Navegações e, os reis, seus patrocinadores. Daí pode-se afirmar que havia uma grande aliança entre a monarquia e a burguesia, visto que seus interesses eram o mesmo – o dinheiro.

Mas, quais são as origens dessa aliança? Na Idade Média, a ampliação do comércio levou a recém-formada burguesia a se sentir tolhida em suas ambições. A economia não atendia à demanda e era necessária a formação de um mercado nacional sem entraves feudais e, em consequência disso, a burguesia passou a apoiar a realeza em suas pretensões centralizadoras contra a poderosa nobreza feudal – que possuía privilégios seculares.

A crescente riqueza da burguesia enfraquecia progressivamente a nobreza feudal, cuja riqueza era basicamente fundiária. Tudo isso acelerou a concentração de poderes nas mãos dos reis que, além do apoio político e material da burguesia, contou com a justificação dos legistas burgueses baseados no Direito Romano, o qual possibilitava a constituição legal do Estado Nacional Moderno.


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