Como Ficou Marcado o Modelo Econômico Brasileiro Durante o Regime Militar? O Que Era o Plano de Ação Econômica Governamental (PAEG)? Como e Por Que Foi Lançado o Plano Cruzado? O Que Caracterizou o Plano Collor? Por Que o Plano Real Obteve Tanto Sucesso?
O modelo econômico brasileiro durante o regime militar foi marcado pelo processo de concentração de rendas e abertura externa da economia. Já no período de transição democrática, importantes avanços políticos ocorreram, como a convocação de uma Assembleia Constituinte que elaborou e promulgou a Constituição de 1988, a qual estabeleceu as eleições diretas em todos os níveis. Outros avanços foram a legalização dos partidos políticos de qualquer tendência, a garantia do direito à greve e à liberdade sindical, a ampliação dos direitos trabalhistas, a intervenção do Estado em assuntos econômicos e o nacionalismo econômico – ao reservar algumas atividades às empresas estatais. Agora veremos com mais detalhes cada um desses períodos:
O Período Militar
O período do governo militar foi
dividido em quatro (4) fases, segundo Gremaud, Saes e Toneto Júnior (1997),
assim descritas:
·
Primeira (de 1964/1967): fase marcada pela estagnação das atividades
econômicas, grandes reformas institucionais e preparação para entrada da
economia brasileira na economia mundial.
·
Segunda (de 1968/1973): fase conhecida
como a do “Milagre Econômico”, tendo o país colhido os frutos dos ajustamentos
anteriores, além da situação internacional apresentar um quadro animador.
·
Terceira (de 1974/1979): fase do recrudescimento da economia, com
instabilidade na economia internacional, após o choque do petróleo, que atingiu
o mundo em cheio. Foi nesse período que foi criado o II Plano Nacional de
Desenvolvimento Econômico com vistas a organizar a economia diante das
dificuldades.
·
Quarta (de 1980/1984): fase assinalada
internamente por recessão, inflação elevada, redução do investimento estatal; e
externamente por um quadro desfavorável devido à elevação dos juros, ao segundo
choque do petróleo e à instabilidade cambial.
No período do governo militar, de
1964 a 1984, o país foi governado por meio de atos institucionais e decretos,
com fortalecimento do executivo e o enfraquecimento do legislativo. Através dos atos institucionais foi criado o
Sistema Nacional de Informação (SNI); inúmeros
direitos políticos foram
cassados; os movimentos sindicais, estudantis e camponeses foram
reprimidos; determinou-se o fechamento do Congresso Nacional; estabeleceu-se o
regime de censura à imprensa. O governo introduziu na economia inicialmente o
Plano de Ação Econômica Governamental (PAEG), que teve como mentores Roberto de
Oliveira Campos e Octavio Bulhões. Nesse plano, foi introduzida a correção
monetária, com a finalidade de corrigir a inflação, e novas regras cambiais,
salariais e tributárias. A retomada do crescimento na economia brasileira no
período militar só foi ocorrer a partir de 1968 e alcançou o ano de 1973,
ficando consagrado como o período do “milagre econômico”. Mas por que o
“milagre econômico” chegou ao fim? Por causa da piora nos cenários – interno e externo.
Internamente, a estrutura produtiva desequilibrou-se; no cenário externo, a
subida dos preços do petróleo, as pressões inflacionárias e a instabilidade
cambial exigiram novos ajustes econômicos. Para Gremaud, Saes e Toneto Júnior
(1997, p. 191), [...] tendência natural da economia em 1974 era a reversão do
ciclo expansivo tanto pelos desequilíbrios externos como pelos internos.
Independentemente do choque do petróleo, Bonelli e Malan (1976) destacam que a
economia já estava operando acima do produto potencial, necessitando de grande
volume de importações de bens de capital e matérias-primas, com o que se
acentuavam as pressões inflacionárias e a tendência aos déficits externos. Na
interpretação de Carneiro (1990, p. 297), o[...] fim do milagre econômico
encerraria também um ciclo festivo de exercício de poder sem limites e sem
prestação de contas, sem oposição, sem incômodos da livre imprensa e sem
compromissos políticos a criar embaraços ao voluntarismo da política
econômica.
Em decorrência dessas
dificuldades apontadas no ano de 1974, o governo formulou o II Plano Nacional
de Desenvolvimento, tendo na mira as indústrias de bens de capital e a
infraestrutura. O Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado com a
finalidade de se transformar em uma alternativa em substituição à gasolina, fez
parte desse plano, assim como o projeto de Itaipu e da Ferrovia do Aço, entre
outros projetos. Diante desse cenário no final dos anos de 1970, as
dificuldades advindas do cenário internacional continuaram e a recessão dos
anos de 1980, decorrentes da diminuição dos investimentos, levaram a década no
Brasil ser designada de “década perdida”. A produção estagnou, a inflação
começou a fugir do controle, os juros internacionais aumentaram, o crédito
diminuiu, a dívida externa sofreu baques profundos, o que marcou o fim de um
modelo de desenvolvimento que precisava sofrer reformulações. Foi nesse clima
que a emenda das Diretas Já se transformou no maior movimento social vivido
pela sociedade brasileira. No final, a emenda foi rejeitada na votação em
plenário, por não ter
adquirido os dois terços dos
exigidos. Consequentemente, as eleições foram para o colégio
eleitoral. Tancredo Neves venceu para
presidente e José Sarney para vice-presidente. Próximo da posse, Tancredo Neves
adoeceu, vindo a falecer, e José Sarney assumiu a presidência da Nova República.
O Período Democrático
Nesta nova fase da República, os desafios foram muitos. O modelo de desenvolvimento econômico esgotou-se, necessitando ser revisto. A economia precisava ser reaquecida por causa do crescimento que se anunciava, mas o processo inflacionário se agravara. Assim, a inflação foi a eleita para ser debelada do cenário, sob pena afetar a estabilidade econômica do País ou de comprometer o crescimento econômico. E, em fevereiro de 1986, foi lançado o Plano Cruzado, no qual uma nova moeda chamada cruzada substituiu o cruzeiro. Nesse momento, o mecanismo de reajuste de salários foi revisto e, toda vez que a inflação atingisse o patamar de 20%, um “gatilho salarial” seria disparado visando corrigir o seu valor. Quase todos os preços foram congelados, com exceção da energia elétrica. Foi estabelecida também uma taxa de câmbio fixa, os aluguéis foram revistos e os contratos prefixados corrigidos por uma “tablita”. O plano teve sucesso no início, houve a queda da inflação e as pessoas aprovaram tanto que algumas resolveram se tornar fiscais, para que o congelamento não fosse desrespeitado. No entanto, passada a fase da euforia, modos de contornar o congelamento foram surgindo, por exemplo, a imposição de ágio por alguns comerciantes. Além disso, podemos observar também que o governo fez um enorme esforço no sentido de não descongelar a economia, isentando produtos de impostos, dando subsídios, liberando as importações de produtos em falta, confiscando produtos que em algumas situações o produtor resolvia não colocar à venda no mercado. Nessa dificuldade de congelamento versus descongelamento, surgiu o chamado “Cruzadinho”, caracterizado pela adoção de um conjunto de medidas como empréstimos compulsórios na compra de gasolina, automóveis e passagens aéreas internacionais. Isso permitiu uma sobrevida ao Plano Cruzado até as eleições para governadores de 1986.
Passadas as eleições, das quais o
governo saiu vitorioso, foi adotado o Plano Cruzado II, com uma série de novas
medidas, na tentativa de controlar o déficit público. Com o fracasso do Plano
Cruzado II, surgiu, em 12 de junho de 1987, o Plano Bresser, que propunha o
congelamento dos preços e dos salários por três meses, a desvalorização do
câmbio, a utilização da tablita nos contratos prefixados. No Plano Bresser, o
déficit público aumentou e começou então uma etapa de discussões em torno da
necessidade de reduzir o peso do setor público na economia. Em 1988, foi
lançado o Plano Verão, mudando a unidade monetária de cruzado para cruzado
novo. No Plano Verão, o salário sofreu perdas, as medidas foram tímidas por
conta da iminência das eleições de 1988 e a inflação acelerou chegando a um
patamar de hiperinflação, seguindo o descontrole das contas públicas, e a elevação
das taxas de juros. Mas foi nos anos de 1990 com a entrada de Fernando Collor
de Mello como presidente que se pôde perceber o descontrole inflacionário e a
necessidade de ajuste da economia, tendo sido proposta uma reforma monetária,
administrativa e fiscal. Foi o período em que o programa de privatizações tomou
força, os preços foram congelados, o sistema de câmbio alterou-se flutuante e
ocorreu o processo de abertura comercial. De acordo com Rego e Marques (2003,
p. 205-206), Plano Collor I, de março de 1990, combinava confisco dos depósitos
à vista e aplicações financeiras com
prefixação da correção dos preços e salários, câmbio
flutuante, tributação ampliada sobre as aplicações financeiras e a chamada
“reforma administrativa”, que implicou o fechamento de inúmeros órgãos públicos
e demissão de grande quantidade de funcionários.[...] Outro plano de
estabilização, o Plano Collor II, foi adotado em janeiro de 1991, em situação
de desespero devido à desaceleração da inflação. [...]
A precariedade do Plano Collor
II, aliada ao desgaste do governo com os efeitos do confisco ocorrido no plano
anterior, assim como às crescentes denúncias de corrupção, acabaram por
determinar o impeachment de Collor em outubro de 1992.Com a saída de Fernando
Collor, assumiu a presidência da República o seu vice-presidente Itamar Franco.
O Ministro da Fazenda do seu governo foi Fernando Henrique Cardoso, e,
respaldado por uma série de estudos realizados, por sua equipe econômica,
lançou o Plano de Estabilização Econômica, que ficou conhecido como Plano Real.
Entre os pontos privilegiados pelo Plano Real, destacaram-se a busca da
ampliação da receita tributária, o equacionamento da dívida dos Estados e dos
municípios, a diminuição da participação do Estado na economia com o estímulo à
privatização, e o estabelecimento de um controle maior sobre os bancos
estaduais (em algumas situações, a realização de estudos visando ao seu
fechamento). O Plano Real obteve êxito em um primeiro momento, com aumento do
Produto Interno Bruto (PIB), graças à ampliação do setor industrial,
agropecuário e de serviços. Outro fator que merece destaque é que a inflação
também apresentou queda, o que contribuiu para que o poder de compra das
pessoas tivesse um incremento surpreendente, o crédito retornou e o salário
passou a ser mais atraente por causa do aumento do poder de compra dos
consumidores. O sucesso obtido pelo Plano Real que Cardoso implementou foi
tanto que culminou com sua eleição para presidente da República por um mandato
de quatro (4) anos e depois foi reeleito, em 1998. Após o governo de Fernando
Henrique Cardoso, foi eleito à presidência da República Luís Inácio Lula da
Silva, que manteve o Plano Real, obtendo alguns resultados com o Programa de
Estabilização Econômica, trazendo de volta o Estado na economia brasileira que
havia sido colocada em segundo plano, devido ao projeto neoliberal defendido em
termos mundiais com muita intensidade. Lula estabeleceu políticas que levaram a
inclusão dos considerados “despossuídos”, como por exemplo a ampliação do
Programas Bolsa-Família, o qual teve um pouco de efeito multiplicador na
economia do País. Diante dos resultados obtidos, a economia conseguiu retomar o
crescimento, adquirindo um pouco de credibilidade externa e fortalecendo o
mercado interno, tanto que a crise mundial vivida a partir de 2008 não surtiu tantos
efeitos que outra situação poderia causar. Daí o País enfrentou as dificuldades
e os desafios de forma mais ou menos controlada e, por isso mesmo, cabe
registrar que a situação favorável da conjuntura internacional do limiar do século XXI favoreceu um pouco a
situação nacional daquele momento.
REFERÊNCIAS
CAMPOS, Roberto de Oliveira. Economia, planejamento e nacionalismo. Rio de Janeiro: APEC, 1963.
CARNEIRO, Dionísio Dias; MODIANO, Eduardo. Ajuste Externo e
Desequilíbrio Interno: 1980-1984. In: ABREU, Marcelo de Paiva (Org.). A ordem
do progresso. Cem anos de Política Econômica Republicana (18891989). Rio de
Janeiro: Campus, 1990. p. 323-346.
CARNEIRO, Dionísio Dias.
Crise e esperança:
1974-1980. In: ABREU, Marcelo de Paiva (Org.). A ordem do
progresso. Cem anos de Política Econômica Republicana (1889-1989). 15. tiragem.
Rio de Janeiro: Campus, 1990.
GREMAUD, Amaury Patrick; et al. Formação econômica do Brasil. São
Paulo: Atlas, 1997.HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26. ed. 11.
Reimp. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

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