Qual Era o Tamanho Original de
Pernambuco? Por Que Seu Território Foi Tão Alterado? Quais Eram as Principais
Divergências de Opiniões em Pernambuco na Época da Independência? Qual Foi a
Importância de Paes de Andrade e Frei Caneca na Luta em Pernambuco?
Existe um drama na geografia do Nordeste brasileiro, o
qual se destaca principalmente em Pernambuco. Pois 200 aos atrás, essa
província era uma das maiores do Brasil, com 278 mil quilômetros quadrados, seu
território era igual ao do Rio Grande do Sul e pouco inferior ao do Maranhão.
No interior, os domínios avançaram até a atual divisa entre a Bahia, Minas
Gerais e Goiás, formando o desenho de uma abóbora.
Incluía, entre outras cidades importantes, Barreiras –
hoje um dos maiores municípios produtores de soja do país. Essa geografia se
alterou bruscamente no começo do século 19 e, em menos de uma década,
Pernambuco perdeu 2/3 de sua extensão original, ficando do tamanho de Santa
Catarina e menor que o Ceará e o Piauí. Entre 1817 e 1824, a província foi
sistematicamente fatiada e espoliada no seu território por razões políticas.
Foi o preço que Pernambuco pagou pelas guerras e revoluções que liderou nesse
período.
Ao longo da história, outros estados tiveram mudanças
em seus territórios e o Paraná – por exemplo – foi comarca de São Paulo até
1853. Mato Grosso foi dividido ao meio em 1977 e, onze anos mais tarde, foi a
vez de Goiás perder sua metade norte, transformada em Tocantins. Em todos esses
casos as mudanças obedeceram a critérios práticos, a fim de facilitar a
administração das regiões distantes e mal atendidas pelas antigas capitais.
Mas, Pernambuco é o único caso de divisão territorial como punição pela sua
rebeldia.
A primeira aconteceu depois da Revolução de 1817, em
que os pernambucanos se insurgiram contra D. João VI e proclamaram uma
república independente. Aí, eles foram derrotados e perderam Alagoas. A segunda
ocorreu 7 anos depois, como resultado da Confederação do Equador, rebelião de
tendência separatista e republicana. Desta vez a facada foi maior: _ por
decisão de D. Pedro I, Pernambuco perdeu a comarca de São Francisco (60% do seu
território), transferida para Minas Gerais. Três anos mais tarde a comarca
seria incorporada à Bahia – onde permanece até hoje.
A proclamação da Confederação do Equador em 1824, foi
uma consequência da dissolução da constituinte. As diferentes visões de Brasil
se confrontaram na assembleia, a qual convocada em 1822 por D. Pedro e uma
delas era a dos federalistas. Esse grupo abrigava tanto republicanos quanto
monarquistas constitucionais e se concentrava em Pernambuco. Uma das razões da
Revolução de 1817 foram as taxas cobradas para sustentar D. João VI no Rio de
Janeiro, pois menos de 32% da arrecadação total da província foram transferidos
para a corte em 1816.
Os federalistas defendiam que o Brasil independente se
constituísse em uma associação de províncias mais ou menos autônomas. Cada uma
teria seu próprio parlamento, forças armadas, orçamento e tesouro. Seria um
país mais parecido com o atual, em que os estados elegem governadores e
deputados encarregados de fazer leis nas assembleias legislativas. Ao
contrário, José Bonifácio queria um governo monárquico e forte centralizado no
Rio de Janeiro, com a desculpa de que isso evitaria o risco de fragmentação
territorial. Em razão dessas divergências, Pernambuco aderiu com muita
relutância à causa de D. Pedro em 1822.
Na opinião do padre carmelita Joaquim do Amor Divino
Caneca, líder dos federalistas pernambucanos – conhecido como Frei Caneca – em
1824, o Brasil tinha todas as condições para formar um Estado republicano e
federativo. Só não o fizera até aquele momento porque os brasileiros haviam
confiado no juramento de D. Pedro de respeitar a constituinte. A dissolução da
assembleia, além de confirmar as suspeitas sobre a índole autoritária do
imperador, significava que o acordo havia sido quebrado. Portanto, cada
província poderia seguir a estrada que lhe parecesse mais adequada.
A história da Confederação do Equador mostra que as
divergências de opiniões na época da Independência não eram apenas uma questão
de preferência, pois elas resultavam de um choque de interesses que envolvia
poder e prestígio. Até o final do século 18, a classe dirigente pernambucana
era dominada pelos senhores de engenho, produtores de açúcar e donos de terras
férteis na Zona da Mata Sul. Eles tinham seus interesses enraizados na
metrópole portuguesa, que comprava seu produto em regime de monopólio.
No entanto, nas décadas seguintes surgiu uma nova
classe de prósperos produtores de algodão na Zona da Mata Norte. Esse grupo já
não dependia tanto da metrópole porque vendia seu produto para as fábricas da
Revolução Industrial inglesa. A intermediação de Portugal não interessava aos
produtores brasileiros nem aos compradores ingleses, porque só encarecia o
produto.
Os reflexos disso na política foram inevitáveis.
Enquanto os senhores de engenho da Mata Sul eram conservadores e tradicionais,
fiéis à coroa portuguesa e a sua extensão no Rio de Janeiro, os novos
produtores de algodão da Mata Norte se mostravam permeáveis às ideias
revolucionárias que levassem à quebra dos antigos monopólios. O conflito se
estendia à Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará em que a produção algodoeira se
tornara expressiva.
A primeira junta de governo de Pernambuco após a
convocação das cortes portuguesas, era presidida por Gervásio Pires Ferreira –
rico comerciante do Recife e veterano da Revolução de 1817. Apoiado pelos
produtores e exportadores de algodão, Gervásio tentou reafirmar a autonomia de
Pernambuco, mantendo uma posição equidistante de Lisboa e do Rio de Janeiro.
Ele parabenizou D. Pedro pelo Dia do Fico, enquanto enviava ofício às cortes
portuguesas declarando-se rompido com o príncipe regente. Em julho de 1822,
mandou uma delegação ao Rio de Janeiro com uma mensagem na qual reiterava
tímidos “protestos de obediência”.
Gervásio se recusou a obedecer às ordens do ministro
da Fazenda para que os estoques de pau-brasil fossem mandados para o Rio de
Janeiro, com o objetivo de amortizar a dívida do Banco do Brasil. Ele acabou
caindo em outubro e substituído pela “Junta dos Matutos”, composta pelos
“senhores do açúcar”. Esta sim, apoiou D. Pedro decididamente mediante a
promessa de que não aboliria a escravidão. As notícias da dissolução da
constituinte foram a gota d’água e, ao chegar ao Recife em novembro de 1823,
puseram fim à morna lua de mel entre os pernambucanos e D. Pedro I.
Em dezembro, o “Grande Conselho” – colégio eleitoral
composto de fazendeiros, comerciantes, juízes, padres e intelectuais –
substituiu a enfraquecida “Junta dos Matutos” por outra, presidida por Manuel
de Carvalho Paes de Andrade. Filho de um funcionário público português, Paes de
Andrade era um rico comerciante e fazendeiro, tendo ligações com a maçonaria
tanto quanto Frei Caneca, Cipriano Barata e inúmeros outros revolucionários
pernambucanos.
A eleição de Paes de Andrade confrontou os
pernambucanos com o imperador, que em novembro nomeou outro presidente para a
província, Francisco Paes Barreto, dono de engenho na Mata Sul. Novamente o
“Grande Conselho” se rebelou contra a nomeação e manteve Paes de Andrade no
cargo. O primeiro semestre de 1824 foi dedicado à preparação da guerra em
Pernambuco. Paes de Andrade mandou capturar quatro escunas da marinha imperial
e uma delas foi rebatizada de “Constituição ou Morte”. Também
encomendou dois navios a vapor da Inglaterra e meia dúzia de canhoneiras e uma
corveta com 18 canhões dos Estados Unidos.
Por sua vez, o governo imperial despachou para Pernambuco
uma pequena frota sob o comando do capitão John Taylor, o mesmo que em julho de
1823 perseguiu a esquadra portuguesa de Salvador até as imediações da foz do
Rio Tejo, em Lisboa. Depois de bloquear o porto de Recife por alguns dias,
Taylor teve de retornar ao Rio de Janeiro diante dos rumores de que Portugal
havia despachado uma poderosa frota com o objetivo de recapturar a capital
brasileira.
A Confederação do Equador foi proclamada a 2 de julho
de 1824. Paes de Andrade convocou as províncias do Norte a juntar-se a
Pernambuco. A fronteira da nova nação seria a margem esquerda do rio São
Francisco de Alagoas até o Maranhão e, na sua bandeira, exibia um quadrado com
uma cruz no meio e as palavras “religião, independência, união, liberdade”.
Nos documentos do governo revolucionário não há menção à palavra “república”,
regime que, desde a derrota em 1817, “ainda não ousava dizer o nome”.
Paes de Andrade convidou as demais províncias a
juntar-se à causa pernambucana. Como as demais regiões estavam firmes no apoio
a D. Pedro, na prática a criação da Confederação só poderia levar à divisão do
país. E as simpatias republicanas das lideranças do movimento, eram inegáveis.
A província que mais apoiou os pernambucanos na Confederação do Equador foi o
Ceará que, ao saber da dissolução da constituinte, as câmaras de Quixeramobim e
Icó proclamaram a república e declararam D. Pedro I destronado.
A reação de D. Pedro ao saber da proclamação da
Confederação foi devastadora, pois além de suspender as garantias constitucionais
na província, despachou tropas por terra e mar e amputou o território
pernambucano retirando dele a comarca de São Francisco. Em agosto, os navios
comandados pelo almirante Cochrane começaram a bombardear as casas e igrejas da
velha cidade do recife, enquanto o exército do brigadeiro Francisco de Lima e
Silva – pai do futuro Duque de Caxias – invadiu a província pelo sul. Paes de
Andrade ainda tentou subornar Cochrane oferecendo-lhe 400 contos de réis (cerca
de 25 milhões de reais, hoje). O almirante, que tinha muito mais dinheiro a
receber de D. Pedro, recusou.
A capital pernambucana foi ocupada em 12 de setembro,
Paes de Andrade se refugiou a bordo de uma fragata inglesa e, com o que restava
do esfarrapado exército da Confederação, Frei Caneca empreendeu uma longa
viagem rumo ao Ceará. Foi interceptado e preso em 29 de novembro e dezesseis
confederados foram condenados à morte.
Na manhã de 13 de janeiro de 1825, dia da execução de
Frei Caneca, as tropas ocuparam as ruas de Recife com o objetivo de impedir
manifestações populares. E levado para o alto do patíbulo, de onde pendia a
corda da força, três carrascos se recusaram a executá-lo. Ao saber disso,
Francisco de Lima e Silva mandou que fosse fuzilado com tiros de arcabuz e,
assim que a vítima caiu, a tropa gritou vivas “à Sua Majestade Imperial”, “à
Constituição” e a “Independência do Brasil”.
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