quinta-feira, 2 de julho de 2020

Barcelona – o Planejamento Estratégico Como Instrumento de Gestão




Como Reproduzir Experiências Urbanas Através do Planejamento Estratégico? Como Foi o Processo de Planificação Urbana da Catalunha? Qual a Importância dos Jogos Olímpicos Para a Cidade de Barcelona?




Toda metrópole possui sua dinâmica própria que vai além da interação das pessoas com o espaço urbano. Essa dinâmica é marcada pelo desenho de seus espaços, pela sua história e pelas relações econômicas, sociais e culturais desenvolvidas nestes espaços. Os espaços modulam as relações presentes neles da mesma maneira que são moldados pelas relações.
Então, a administração de uma cidade ganha um papel primordial nesse cenário complexo; ou seja, o papel de planejar e intervir nesses espaços para que essas interações se deem da melhor forma possível. Completando essa complexidade – presente nessas grandes metrópoles nas décadas de 70 e 80 – esses espaços passaram a se configurar como centro de negócios.
Assim, a administração dessas cidades, seus cenários urbanos e consequentemente seus espaços se tornaram cada vez mais complexos. Esses centros urbanos foram designados por alguns autores como cidades globais e possuem características similares. Eles acreditam que é possível reproduzir essas experiências por meio do planejamento estratégico, que surgiu como resposta à crise do antigo padrão de planejamento urbano.
Dessa forma, esse texto aborda a questão urbana, procurando observar quais os condicionamentos que levaram à adoção e a perpetuação do processo de planificação da cidade de Barcelona, sob a perspectiva  da administração pública. O objetivo principal é analisar alguns mecanismos de gestão dos planejamentos estratégicos da experiência dessa cidade, verificando quais condicionantes permitiram a adoção e a perpetuação do seu método de planificação.
Existe uma história que se destaca pelo sentimento de nação presente na Catalunha, que pode ter influenciado uma tradição de planificação continuada, uma estrutura administrativa municipal e regional e, além disso, deve-se considerar a capacidade dos seus gestores em negociar e a janela de oportunidade aberta pelas Olimpíadas de 1992.
Por vários séculos, a Catalunha passou por um processo de recuperação e de valorização de suas raízes, tornando-se uma região diferente do restante da Espanha. A partir do século XIX, a Catalunha se organizou em torno de um projeto político cujo objetivo era solidificar sua identidade regional e, esse processo, foi acompanhado por um crescente desenvolvimento econômico.
Esse desenvolvimento se estendeu até a Guerra Civil (1936) que restituiu 40 anos de ditadura. Durante o período da ditadura, novamente a Catalunha voltou a ter sua autonomia reduzida, sua língua proibida e sua identidade cultural perseguida por Franco. Entretanto, uma questão tornou a Catalunha diferente das demais, pois a atual configuração do seu poder político não é definida pela Constituição de 1978, mas sim pelo Estatuto da Autonomia de 1977.
O fato dessa região ser independente com instituições autônomas desde o século X e ter sempre lutado para manter sua autonomia, faz com que - de alguma forma - seu processo histórico gere dotes socioculturais e, esses dotes, se constituem por meio do exercício da democracia e do associativismo ao longo do tempo, e contribuem para a formação de um estoque de capital social acumulado durante o processo histórico.
Em relação à região metropolitana de Barcelona, há mais do 50 anos que existem instituições de caráter metropolitano, o que demonstra uma presentes na região já estavam concertados dentro dessas entidades, o que pode ter facilitado o salto de escala dado do 3º plano estratégico de Barcelona, um plano municipal para o 4º plano e um plano metropolitano, que engloba os 36 municípios da área metropolitana. Esse associativismo acabou corroborando a existência dos dotes socioculturais delineados, porque na Catalunha o exercício democrático e o associativismo constituíram um estoque de capital social acumulado durante o processo histórico.
Os efeitos da crise dos anos 70 e os seus reflexos em todo mundo fizeram com que muitos governos reestruturassem a administração pública, incrementando a capacidade de resposta aos anseios de grupos de interesse que pressionavam o governo em busca de políticas públicas para tender suas demandas. Foi o que ocorreu na Espanha, na década de 70, quando uma profunda crise estimulou o governo a buscar novas soluções.
Nesse sentido, o governo focou nas reformas administrativas que incrementassem sua eficácia, discutindo os critérios que tornaram os problemas prioritários. Assim, a administração pública espanhola passou a analisar quais objetivos traçar para alcançar resultados. Logo, na Espanha, essas preocupações impactaram a estrutura da administração pública em seus diferentes níveis.
Em 1º lugar, a reestruturação passou a redirecionar o enfoque dos estudos sobre administração pública, que deixaram de ser centrados na legitimidade de suas ações, adotando uma perspectiva voltada para os resultados de suas atuações e das técnicas de análise que permitiram melhorá-las. Esse novo foco poderia tornar plausível o trabalho da realidade política e administrativa para a qual a política pública irá ser elaborada, tornando mais fácil dar continuidade aos programas da administração pública.
Esse novo foco pode tornar mais eficiente as referidas políticas públicas; contudo, a natureza da administração pública não permite a aplicação direta de técnicas provenientes do ambiente privado e, dessa forma, o mais correto seria a combinação entre uma mentalidade de melhora da gestão e as particularidades do setor público.
Para a aplicação dessas diretrizes, o 1º passo seria definir o problema para que se possa pôr em marcha uma política pública. Em Barcelona não foi diferente, pois em 1979 a prefeitura se encontrava numa profunda crise. e o problema a ser enfrentado foi o fato de a administração pública local não conseguir responder às demandas da cidade e de seus cidadãos.
Para resolver essa questão, iniciou-se uma reforma administrativa com o intuito de pôr em ordem a máquina estatal da administração municipal e impulsionar políticas que dessem respostas às múltiplas demandas sociais. O rigor e a formalidade administrativa marcaram esse primeiro movimento de reestruturação da prefeitura, em que a base da administração local foi organizada e assentada, para posteriormente iniciar o segundo movimento de mudança. Esse segundo movimento teve início em um novo mandato municipal e voltou seu foco para a eficácia do funcionamento da prefeitura.
Mediante essa nova perspectiva, a capacidade de inovação dos poderes públicos para enfrentar as novas necessidades passa a ser uma condição importante para se estruturar políticas públicas e desenvolver programas de atuação com continuidade. Assim, a agenda de mudança na administração da cidade teve continuidade em um 2º movimento de mudança, o movimento de transformação, que se iniciou na década de 90, tendo seu ponto máximo em 1992, ano dos Jogos Olímpicos.
Sendo assim, o modelo de análise de políticas públicas, além de se encaixar nas medidas adotadas pelo município para solucionar a crise que a administração pública enfrentava, parece servir de base de análise para a estruturação da cidade para sediar os Jogos Olímpicos de 92 e, posteriormente, para explicar a decisão da prefeitura em manter o nível de investimento elevado para que a cidade continuasse crescendo após as Olimpíadas.
Pode-se observar que na formação da agenda política diferentes fatores interferem, desde a elaboração do problema até a esfera decisória da política pública elaborada para solucioná-lo, se perpetuando em sua implementação. Assim, uma vez definido o problema a ser resolvido pelo poder público, é necessário seguir adiante traçando as diferentes alternativas de ação.
Foi o que aconteceu na década de 90, onde o modelo gerencial desenvolvido pela prefeitura tomou impulso. Até 1992 - ano dos Jogos Olímpicos - o esforço de investimento foi muito grande, pois era necessário transformar Barcelona não apenas para as Olimpíadas, mas também para responder ao déficit histórico de demandas de infraestrutura e dos cidadãos.
Para responder a esse déficit e, ao mesmo tempo manter o nível de crescimento na cidade após a realização dos Jogos, a agenda da prefeitura foi alterada em torno de um processo de planificação continuado, decisão que vai ao encontro da elaboração e implementação do primeiro plano estratégico da cidade.
Assim, os Jogos Olímpicos mudaram profundamente a cidade e foram produzidos incrementos significativos atrelados à decisão de se intensificar os ingressos fiscais. Era prioritário otimizar recursos, racionalizar a organização governamental e sua gestão, além de melhorar os serviços prestados aos cidadãos. Dessa forma, antes dos Jogos se realizarem, algumas diretrizes administrativas foram tomadas e, a partir de 1991, o governo municipal iniciou uma política de contenção de despesas e de modernização administrativa.
Portanto, após essas reformas, Barcelona se tornou conhecida na Europa por seus ambiciosos programas de planejamento urbano realizados sob a liderança do município. Alguns autores defendem que o "modelo Barcelona" de planejamento emergiu dessa experiência, conjuntamente com uma abordagem distinta para governança urbana e, em função disso, pode-se dizer que esse princípio se aplica particularmente ao período posterior às Olimpíadas.



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