quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A Diferença Entre o Merchandising em Novelas e a Publicidade


Que Tipo de Discurso se Utiliza na Publicidade, na Propaganda e nas Telenovelas? Qual é o Conteúdo do Discurso no Merchandising? Por Que o Merchandising Televisivo é Subliminar?




Em termos de linguagem, pode-se dizer que a publicidade e a propaganda configuram um universo de discurso persuasivo que se combina com o discurso sedutor (mágico, religioso), sendo regido por uma estrutura de poder da ordem modal do querer. Isto é, trata-se de uma vontade de ter – ou ser – algo a partir de um bem de consumo. ([1])




O discurso da telenovela é resultante de uma sobre modalização ([2]) da ordem de um poder à fazer à querer a fim de estimular um crer na situação fictícia como se ela fosse real. Ou seja, o telespectador é persuadido a querer à ver a telenovela para crer nela, pois só depois de mergulhar na trama ficcional  e estar seduzido por ela, é quando ele estabelece a relação de verossimilhança da ficção em relação à realidade.

O discursos do merchandising seria uma espécie de conversão de discurso da telenovela para o discurso publicitário que se dá através de um processo metas semiótico, que acarreta na inversão da sobre modalização do discurso da telenovela, pois ação de merchandising visa um fazer à crer naquela situação ficcional, que poderia ser real, para estimular um querer no telespectador.

Desta forma, pode-se concordar com Calazans ([3]) e Tahara ([4]) que consideram o merchandising, em princípio, como uma técnica quase subliminar, uma vez que os produtos, serviços e ideias são difundidos através de cenas que estimulam situações normais do cotidiano, tornando-se um elemento forte para a análise das interações entre ficção e realidade, facilmente incorporados pelo telespectador, quase que de forma despercebida.

Mas essa sutileza do merchandising pode ser colocada em xeque, quando um produto ou serviço é mostrado de forma ostensiva. Percebe-se que há certa rejeição por parte do público, o qual considera esta técnica abusiva. ([5])





Com relação a esta última crítica, muitos diretores comerciais das emissoras de TV, como Walter Avancini, justificam o merchandising dizendo que “a televisão divulga pela publicidade produtos para a sociedade, a qual passa a buscar nos seus cotidianos por estes mesmos produtos.

A novela – na sua linha dramática – busca na realidade de comportamento. Então ela não pode ser separada no merchandising. E a TV, enquanto indústria, também precisa deste artifício para a sua sustentação financeira.

As justificativas apresentadas não eximem o merchandising da sua carga manipulatória. O fato não se restringe apenas a uma questão ética, mas acarreta na discussão sobre a qualidade da obra, pois sua intervenção na narrativa, se não for muito bem-feita, pode caracterizar um momento de parada no fluxo da história das personagens, o que desagrada o público.

Para entender o desagrado do público com relação ao merchandising, cabe aqui reforçar as diferenças entre momento do discurso ficcional (telenovela) do discurso publicitário em si e do merchandising, que é um discurso híbrido com características dos dois gêneros.

O momento da telenovela é um momento de lazer, o seu discurso tem como intenção o princípio modal da sedução, do fazer à crer, a publicidade também usa a sedução, mas sua finalidade modal é persuasiva, o fazer à querer, o seu momento causa um sentimento de desagrado no público, pois o horário comercial caracteriza uma parada na programação, no caso aqui observado da telenovela, fato que tira o telespectador de seu mergulho, do seu envolvimento de sedução com a telenovela, como se explicou anteriormente.

O merchandising, por caracterizar uma ação publicitária no espaço da telenovela, se não for bem realizado, traz consigo o mesmo princípio que o horário comercial causa no telespectador.




Pois, na ação de merchandising, a modalidade da sedução da telenovela é colocada em segundo plano, neste momento da narrativa o objetivo do discurso não é mais fazer à crer, é um fazer à crer (sedutor) visando o querer, modalidade da vontade em primeiro plano, como na publicidade, que seduz em função de estimular vontades nas pessoas.

Portanto, pode-se afirmar que a diferença entre o Merchandising em telenovela e a Publicidade é puramente formal, no plano da expressão, pois no conteúdo a estrutura de poder dos dois discursos é regida pela mesma sobre modalização modal.



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([1]) Sobre as estruturas de poder dos discursos e modalidades que regem os universos de discurso, explica-se que estas são terminologias das sociossemiótica. Neste sentido recomenda-se a leitura do texto de PAIS, C. T. “Estruturas de poder dos discursos: elementos de uma abordagem sociossemiótica”. Língua e Literatura, São Paulo: FFLCH/USP, p. 39-50, 1987; e de GREIMAS, A J. Semiótica do Discurso Científico. Da modalidade. São Paulo: SBPL/GLOBAL, 1976.

([2]) PAIS, C.T.  Aspecto de uma tipologia dos universos de discurso. Revista Brasileira de Linguística. São Paulo, SBPL, v. 7 n. 1, p. 43-68, 1984.  Universo de discurso é um conjunto de socioletos existentes numa cultura, como diz A J. GREIMAS na sua obra Semiótica e Ciências Sociais. São Paulo: Cultrix, 1981. Esses universos de discurso são na prática, da tecnologia, entre outros, pelos quais é lícito reunir por critérios de equivalência, discursos individuais, em referência a uma norma discursiva, que configura um universo de determinado discurso, de uma cultura.
([3]) CALAZANS, Flávio.  Propaganda subliminar.  São Paulo: ECA/USP, 1990. 359p.  Dissertação de mestrado.

([4]) TAHARA, Mizuho.  Contato imediato com a mídia.  5. ed.  São Paulo: Global, 1986.
([5]) NELSON GOMES e o merchandising na televisão brasileira. Meio e Mensagem, São Paulo, v. 13, n. 448, p. 5 mar. 1991. Opinião.

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