O Que Significa
Orçamento Base Zero? Por Que Ele Tem Dado Resultados Para Algumas Empresas e Outras Não?
Tão certo quanto o lançamento de uma nova
dieta a cada verão é a busca por uma nova forma de gerenciar e aumentar os
lucros das organizações, quando o mercado está estagnado. O curioso é que as
duas coisas têm em comum a necessidade de um trabalho constante de revisão de
objetivos. No mundo empresarial, o modelo de gestão mais comentado responde
pelo nome de “orçamento base zero”.
A obsessão com os custos tem sido um dos
pilares da gestão de empresas por onde passou o trio Jorge Paulo Lemann, Marcel
Telles e Carlos Alberto Sicupira, sócios da 3G Capital – amado por acionistas e
odiado por alguns líderes, que nutrem desprezo pelo método do 3G com inveja dos
resultados alcançados.
O histórico dos três empresários fala por
si só e, para ter uma ideia, apenas nos últimos anos e nas maiores operações,
quando a cervejaria americana Anheuser-Busch se fundiu com a belgo-brasileira
InBev, mais de mil funcionários perderam o emprego. Doze meses depois, a
corporação havia multiplicado seus lucros por dez. Em 2013, o 3G comprou a
Heinz (ketchup) e, dois anos mais tarde, adquiriu a Kraft e criou a Kraft Heinz
– segunda maior empresa de alimentos do mundo.
Desde então, 11 executivos e outros 7 mil
funcionários foram dispensados. Em 2017, a Kraft Heinz teve um lucro líquido de
U$ 944 milhões, uma melhora de 12% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Os resultados foram bons, mas a reputação ficou abalada. No mesmo ano, A
Unilever rejeitou uma oferta de compra no valor de U$ 143 bilhões, feita pelo
grupo 3G. A investida fracassou porque a 3G subestimou a aderência da Unilever
ao crescimento sustentável.
Apesar das divergências, a multinacional é
uma das muitas organizações que estão seguindo (alguns) pontos do receituário
da Kraft Heinz, como a criação de um plano de melhoria para um horizonte de 3
anos, o corte de 30% dos gastos com publicidade e a redução do quadro de médios
gerentes. O fato é que, depois do fracasso da investida do 3G sobre a Unilever,
outras empresas se apavoram com a ideia de serem o próximo alvo do fundo de
investimento. “Eles podem falar que vão respeitar a herança, colocar o nome na
frente do grupo, mas no final do dia, o que o acionista quer é lucro”, disse
uma ex-funcionária de RH da Interbrew que se fundiu com a brasileira AmBev em
2004, para criar a Inbev.
Agressivo, esse estilo de trabalho tem
críticos e, um deles, é o presidente da Nestlé que, em uma reunião com
acionistas em 2017, afirmou que a estratégia de cortes pode aumentar lucros em
curto prazo, mas compromete a longevidade da companhia. Mas isso não significa
que a Nestlé deixará de promover mudanças: o investimento em comércio
eletrônico, o qual aumentará as vendas.
Buscando replicar os lucros, muitas
organizações estão seguindo esse modelo como a Campbell Soup e a Kellogg, e,
algumas empresas das áreas financeiras e de energia, também. Segundo estudos,
38% das 406 grandes empresas americanas pesquisadas usaram o orçamento base
zero em 2016, ante 10% em 2014. Esse orçamento obriga os executivos a
questionarem seus custos de forma permanente, diferentemente do modelo
tradicional, que funciona quase no piloto automático.
Fabíola Overrath – Diretora da AmBev –
afirma que o orçamento base zero não é sobre “corte de custos”, mas sobre
“encontrar eficiência”. “Todo ano eu repasso meu orçamento a partir do zero
porque isso garante que eu sempre vá procurar a melhor forma para investir. É
uma questão de disciplina”, disse ela.
O jeito 3G de administrar começou a ser
desenhado no Banco Garantia em 1976 que, depois de comprar a Brahma em 1989,
Lemann e seus sócios deram um choque de gestão. Outro fator importante é a
coerência. “Se você quer cortar custos, mas anda de helicóptero e faz festa de
fim de ano no restaurante mais caro de São Paulo, sua mensagem não é ouvida”, disse
ela.
Mesmo depois que as paredes do restaurante
da empresa – dividido por níveis hierárquicos – foram derrubadas, os
funcionários ainda faziam distinção como se houvesse uma linha invisível entre
eles. “O Marcel, então Presidente, começou a se sentar do lado que antes
ficavam os funcionários do chão de fábrica. Ele liderou pelo exemplo”, afirma a
Diretora.
Nas empresas do grupo, a área de RH leva o
nome de “Gente e Gestão”. Essa mudança foi colocada em prática em 1997, pois
antes havia um grupo dedicado à gestão de resultados e outro aos processos do
Departamento Pessoal. Para Célio Nunes – da Advisia Investimentos – esse modelo
não funciona em todos os lugares. “Setores, graus de maturidade, ambientes
regulatórios, competição e complexidade operacional diferentes quanto aos
sistemas de gestão que devem ser utilizados”, afirma.
Segundo dados da Deloitte, 65% das
empresas que adotaram o orçamento base zero falharam em suas metas. Outro risco
é a inibição da criatividade e da inovação, pois alguns projetos demoram para
apresentar resultados. A fabricante de carros elétricos Tesla, por exemplo,
nunca teria nascido no 3G, pois queimou caixa durante anos.
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